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Dom Cláudio Hummes: “o Sínodo da Amazônia não foi convocado para repetir o que a Igreja já diz, mas para avançar”

Por Luis Miguel Modino

Podcast Outro Papo de Igreja, do Serviço Teológico Pastoral

Nesta segunda-feira, 20 de agosto, iniciou o III Encontro da Igreja Católica na Amazônia Legal, que até o dia 23 reúne na Maromba de Manaus, 55 bispos da região amazônica brasileira, representando as 56 dioceses e prelazias existentes. O tema principal que vai ser debatido ao longo dos próximos dias é o Sínodo Pan-Amazônico, momento em que “temos que ser sinal e instrumento como Igreja, sinais claros da força do Amor de Deus”, como reconhecia Dom Francisco Merkel, bispo de Humaitá.

Os dois encontros anteriores da Igreja na Amazônia Legal, “fizeram grandes coisas para nossa caminhada em conjunto”, segundo o Cardeal Cláudio Hummes, Presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia e da Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM. Desde essa perspectiva, Dom Cláudio invocava o Espírito “para que nos ilumine, nos guie e gere em nós uma alegria evangélica”, insistindo em que “é importante que realizemos este encontro com coragem e paixão”, lembrando as palavras do Papa Paulo VI, “Cristo aponta para a Amazônia”.

Nessa mesma perspectiva, e dentro do processo sinodal, Dom Adolfo Zon, bispo de Alto Solimões, vê o encontro como “um primeiro momento aonde vamos nos encontrar e ver quais são os pontos mais importantes, que ao longo destes dias de preparação, e sobretudo nestes messes em que caminharemos rumo ao instrumento de trabalho, podem ajudar a detectar os pontos mais importantes que merecem ser refletidos”.

Dom Edson Damian, bispo de São Gabriel da Cachoeira, também destacou “a importância deste encontro porque a maioria das nossas dioceses ainda não fez um encontro diocesano para receber as propostas que virão das comunidades, das paróquias e também das organizações e instituições indígenas”. Seguindo a idéia de Dom Adolfo Zón, “nós aqui reunidos vamos juntos aprofundar as tésis principais e também as perspectivas que esse documento abre para que depois nas nossas assembléias a gente possa incentivar ainda mais e fazer avançar as propostas que virão das nossas comunidades”, afirmava Dom Edson.

O mais interessante nas palavras do bispo de São Gabriel da Cachoeira está no fato de insistir em que “nós bispos teremos que levar para esse sínodo aquilo que vêm da base, aquilo que as comunidades vão apresentar e principalmente onde estão os povos indígenas, os ribeirinhos, os povos tradicionais, pois eles são os principais protagonistas deste Sínodo, e nós queremos escutá-los com muito respeito e com muita sensibilidade pastoral”.

Dom Cláudio Hummes também tem insistido em “quanto é importante ouvir os clamores dos povos da Amazônia, num exercício diário de estar junto, neste momento histórico em que os povos da Amazônia estão mais ameaçados do que nunca”, se fazendo eco das palavras do Papa Francisco no discurso aos povos indígenas em Puerto Maldonado. O Presidente da REPAM, seguindo as idéias do Papa, insiste em que “a Amazônia é banco de provas para a Igreja acertar o caminho. Num momento decisivo da história da Amazônia a Igreja é chamada a iluminar”.

Isso se faz possível com “uma Igreja muito mais próxima, mesmo com as grandes distâncias, que o povo sinta o calor da Igreja, uma Igreja solidaria que defenda os povos”, recordava o Cardeal Hummes, pedido que os indígenas fizeram ao Papa em Puerto Maldonado, “uma Igreja profética que denuncia e indica caminhos”.

Este Sínodo está “no contexto da Evangelii Gaudium, da Laudato Si, da Misericordiae Vultus, de Aparecida e do Vaticano II” segundo Dom Cláudio, e “quer resgatar aspectos do Vaticano II que ainda não foram desenvolvidos”. Por isso, continua o cardeal, usando palavras do Papa Francisco, “a Igreja não deve ter medo do novo”. Nesse sentido, o Presidente da REPAM afirma que “o Sínodo não foi convocado para repetir o que a Igreja já diz, mas para avançar”.

Diante de possíveis atitudes que podem levar a pensar em algumas dioceses que o Sínodo não contempla suas prioridades, o Cardeal Hummes insistia em que “o Sínodo quer que todas as pastorais e movimentos tenham um rosto amazônico, que surja um clero autóctone e indígena e que seja desenvolvido um processo de inculturação, fazendo realidade uma Igreja indígena e não só indigenista”.

O Sínodo da Amazônia “será histórico, somos nós que vamos traçar os novos caminhos desta Igreja”, afirma Dom Cláudio, e por isso “não podemos ter medo”. Nesse sentido, ao falar sobre os ministérios, o Presidente da REPAM, na procura de caminhos novos para que o povo tenha mais, melhor e freqüente aceso à Eucaristia, que é o centro da vida cristã, dizia que “há liberdade de discussão sobre os ministérios”, inclusive sobre a possibilidade de ordenação de homens casados, dada a extrema necessidade na região, mas insistindo que “esse não é o único tema do Sínodo, não é o tema central”.

Por isso, o Cardeal Hummes convidava os bispos presentes a deixar que “o Espírito Santo nos abra novos horizontes para que a Igreja possa servir melhor, nos lembrando dos missionários e missionárias do passado, cujo exemplo nos deve encorajar”.

Dom Mário Antônio da Silva, bispo de Roraima e Presidente do Regional Norte 1 da CNBB – Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil, vê que o Sínodo “nos interpela a estar e caminhar juntos, e este encontro entre os bispos da Amazônia aqui no Brasil consolidam uma caminhada em conjunto para analisar a nossa realidade, oferecendo propostas e sugestões com coragem para o Sínodo”.

Dada a situação dos migrantes e refugiados venezuelanos, situação que em Roraima tem gerado diversos conflitos, Dom Mário Antônio mostrava sua indignação sobre a situação, especialmente na cidade fronteiriça de Pacaraima, se perguntando “como oferecer um futuro sereno e um presente mais digno para os migrantes e refugiados?”. Junto com isso, o bispo de Roraima insistia em que “o mundo espera da Amazônia uma proposta séria de ecologia integral, de especificar o que ela é, que prioriza pessoas e comunidades”.

Finalmente o anfitrião do encontro, Dom Sérgio Castriani, começava suas palavras dizendo que “esta semana para a Igreja de Manaus será um tempo de graça…, nós pastores da Amazônia vamos mais uma vez colocar em comum a alegria do Evangelho vivido nesta parte do Brasil. Uma alegria serena que não esconde os grandes desafios que enfrentamos nesta tarefa que vai além das nossas forças”.

A importância do encontro está, segundo o Arcebispo de Manaus, em que “se realiza nas vésperas de dois sínodos cuja temática nos toca de maneira especial. Juventude e Amazônia são realidades que se complementam”. Na Amazônia a população é ainda jovem, e “a juventude é a primeira vítima da depredação da natureza que transformas nossas periferias em celeiros de usuários e traficantes que matam sem dó e piedade”, segundo Dom Sérgio, que afirma que “só haverá futuro para a Amazônia se conquistarmos os corações dos jovens para suas grandes causas”.

O Arcebispo de Manaus insistia em que já existe uma Igreja com rosto amazônico, que se manifesta nas comunidades desde o encontro de Santarém, em 1972, e que, mesmo diante dos avanços conquistados, “as necessidades ainda são grandes e as nossas características regionais exigem soluções diferenciadas”.

Texto publicado no dia 21 de agosto de 2018.

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