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Leitura feminista e libertadora da bíblia

Podcast Outro Papo de Igreja, do Serviço Teológico Pastoral

A ponta do iceberg emergiu com o distanciamento social, ‘ficar em casa’, e tornou mais evidente as relações feridas que o patriarcado e o kyriarcado provocaram em nós, na sociedade e nas igrejas.  Minha colaboração no Portal das CEBs quer oferecer um caminho de cura e reconstrução das relações.

Este caminho é a Leitura Feminista e Libertadora da Bíblia, ou seja, um caminho de interpretação que possibilite uma hermenêutica bíblica feminista e libertadora. A bíblia, para nós mulheres, foi e ainda é um livro fechado, usado para legitimar o poder, domínio e exclusão, e até a violência contra a mulher.

Encontrar a chave para abrir a porta hermeneuticamente fechada desse livro é fundamental. Ao abri-lo poderemos encontrar a Palavra que aponta o caminho para uma leitura e vivência libertadora.

Esta chave tem cinco passos e quatro marcos.

1º Passo: realidade

A vida das mulheres (e das pessoas LGBTQI), seu corpo, seu cotidiano, suas lutas para se libertar do machismo, sexismo, racismo impostos ou introjetados. Apreender a ler o simbolismo que revela sua experiência humana no universo.

2º Passo: interagir

Encontrar as mulheres na bíblia e dialogar com elas. Perceber que apesar da distância histórica nossas vidas estão interligadas, interagem…

3º Passo: suspeitar

O Patriarcado anulou, silenciou, ignorou a presença da mulher na história e na bíblia. A suspeita é atitude, é intuição que abre as possibilidades de investigar. Permite encontrar a presença da mulher tanto na história como na bíblia: presença esquecida, negada, silenciada, explorada, dominada, sempre em função de… Liberdade de fazer perguntas embora incomodadas por mexer no texto bíblico.

4º Passo: deconstruir – nomear

Os três primeiros passos nos preparam a dar o quarto. Momento importante, pois nos coloca em contato direto com o texto, buscando uma exegese fiel ao texto e às mulheres. Este momento exige um estudo sério e fiel, para poder: Desconstruir: o que o patriarcado nos transmitiu e deixou como herança, e Nomear: a mulher como sujeita da história e da revelação.

5º Passo: reconstruir

A partir da pesquisa, exegese, interpretação realizada, dos novos paradigmas, da teologia feminista. Devolver a presença e a palavra às mulheres. Liberdade de recriar, reescrever, festejar, celebrar os textos bíblicos, para encontrar o sagrado na vida cotidiana e política das mulheres. 

Marcos de orientação 

  1. Categoria de gênero

A sociedade é um tecido de relações: sociais, geracionais, étnicas, raciais, de classe e de gênero. As relações de gênero são uma conceituação que cada grupo social elabora determinando o papel a ser ocupado pela mulher e pelo homem na sociedade e as atitudes a serem vividas: construídas determinando papéis e atitudes.

  1. Leitura histórica na perspectiva da mulher

A história oficial é his-tory, quer dizer, história de homens vencedores, ricos e brancos. As mulheres sobrevivem, ou melhor, são silenciadas e anuladas. Esta maneira de fazer história é também arraigada na bíblia e nas nossas igrejas: nossa história de fé é história patriarcal.

  1. Teologia e Espiritualidade da mulher

Todo nosso ser fala do Divino: tem entranhas, tem útero, tem seios… Cuidados maternais, gratuidade, fidelidade… Força criadora e regeneradora… Nosso corpo de mulher fala da Deusa: nos desafia a nomear a Deusa, a encontrar a espiritualidade que nos sustente em dar à luz relações curadas e recriadas.

  1. Autoridade Bíblica

Acontece um encontro: o corpo das mulheres e o corpo que é o texto bíblico. Corpos que anseiam se tocar, toques amorosos, tristes… Provocam uma pergunta: onde reside a autoridade bíblica? A Divindade se revela como dádiva nas relações dos corpos e dos corpos-textos. A autoridade bíblica se revela nas múltiplas relações que tecem a vida, que assumem a defesa da vida como sagrada.

A autoridade bíblica brota dos corpos e das relações cotidianas e políticas em defesa da vida. É a Liberdade de dar respostas parciais, luzes ao hoje, mas que amanhã terão outra luz. Liberdade de recriar, reescrever, festejar, celebrar, encontrar o sagrado na vida cotidiana e política.

Tea Frigerio

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