Nada acabou, continuamos navegando

Por Luis Miguel Modino

A melhor maneira de ser feliz é ver também feliz quem está com você na mesma canoa. Creio que temos vivido um tempo de graça, expresso em tantos momentos em que o Espírito de Deus se manifestou, principalmente através da voz de pessoas específicas, que com seus esforços conseguiram fazer realidade o que muitos não esperavam, parecia que a canoa estava afundando.

Sabemos que algumas vezes as dificuldades existem, mas Deus nos dá a capacidade de discernir e saber superá-las para que nossa jornada continue. A Igreja na Amazônia entrou em um processo de conversão, de novos caminhos, de uma nova navegação, para torná-la mais presente na vida dos povos, a partir de uma atitude de escuta, mostrando que está ao seu lado em todo momento.

Iremos além se continuarmos juntos, se nos convencermos de que juntos somos mais, se seguirmos as indicações de quem hoje está nos guiando para onde devemos continuar nossa jornada. Sim, refiro-me ao papa Francisco, alguém de quem ouvi dizer que ele tem Deus e lhe dá, algo que verifiquei, especialmente em seus gestos, simples, mas que atingem o coração da maioria, sempre sabendo que os corações de pedra não são coisa do tempo dos profetas bíblicos.

Eu nunca imaginei me ver em algo semelhante, mas reconheço que foi um momento em que descobri a presença de Deus que caminha com seu povo, com a Igreja. Penso que a imagem do Povo de Deus que peregrina se tornou muito presente no dia em que o trabalho começou, rostos felizes, embora também houvesse alguns que insistem em encerrar Deus em suas mentes e estruturas pequenas. Os mesmos que assistiram com olhos inquisitórios no outro momento em que descobri tudo isso, a Via Sacra, onde os gritos da Mãe Terra e dos povos ressoavam no centro do catolicismo, onde o sangue derramado dos mártires era apresentado como fonte de Vida para a humanidade.

O que experimentei nas últimas três semanas é o resultado de uma longa jornada, no meu caso de atravessar rios e ares de uma Amazônia que entrou pelos poros da minha pele e penetrou nas minhas veias. As letras que tenho escrito recolhem a vida de muitas pessoas, em cuja sabedoria, aquela que não consta nos livros, encontrei a inspiração para dizer ao mundo que a Amazônia, sua Igreja, os povos que a habitam, especialmente os povos originários, contêm muitos elementos que revelam a presença de um Deus que não está trancado nas estruturas humanas.

São povos que nunca praticaram a religião do eu, praticada por quem continua a “considerá-los inferiores e de pouco valor, desprezam suas tradições, apagam sua história, ocupam seus territórios, usurpam suas propriedades”, como o Papa Francisco nos disse na homilia da Eucaristia com a qual a assembleia sinodal foi encerrada. Na maneira de entender a vida, da comunidade, eles nos mostram que “a verdadeira adoração a Deus passa pelo amor ao próximo”.

Embora eu não estivesse na sala sinodal, reconheço que me senti parte de uma história de construção coletiva que continua e onde tentaremos continuar fazendo o que o Papa Francisco disse àqueles de nós que estávamos na saída da última congregação geral do Sínodo, “Informem bem”. Isso significa ser fiel às vozes do povo e à voz da Igreja, à voz de Pedro, que hoje guia nossa canoa. Alguns, aqueles que sempre tentaram afunda-la, também nessas três semanas, com certeza já desceram, porque descobriram que têm pouco a fazer, Deus mostrou mais uma vez que Ele está nos acompanhando, Ele é o dono da canoa. Agradeço a Ele por me permitir estar lá dentro, também quem me convidou para subir, porque as mediações humanas também contam.

Faço minhas as palavras da homilia de Francisco, na tentativa de deixar para trás o que ele denuncia ” Quantas vezes, mesmo na Igreja, as vozes dos pobres não são escutadas, acabando talvez vilipendiadas ou silenciadas porque incômodas”. Portanto, “rezemos pedindo a graça de saber escutar o clamor dos pobres: é o clamor de esperança da Igreja”. Relatar isso também é uma maneira de testemunhar o Evangelho. Nessa, estamos e continuamos.

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