Celso Pinto CariasColunistas

A nova edição do Missal não é solução para a pastoral litúrgica

Podcast Outro Papo de Igreja, do Serviço Teológico Pastoral

Para começo de conversa, é importante destacar que a coluna não está fazendo uma crítica ao Missal. Trata-se da observação pastoral ao processo de recepção da nova edição, terceira, do mesmo Missal chamado de Paulo VI. Esta edição é de fundamental importância para enriquecer e valorizar a eclesiologia do Concílio Vaticano II.

Contudo, surpreende-nos que a Igreja Católica no Brasil tenha feito tanto estardalhaço para divulgar tal edição, com Missa para receber o Missal, com inúmeras iniciativas formativas, com ampla divulgação, sendo que a situação da liturgia, do ponto de vista pastoral, tem exigido um grande esforço para mudar o modo como católicos tem participado, efetivamente, dos processos litúrgicos, e pouco se tem feito para alterar tal situação. Evidentemente, há setores que procuram preencher esta lacuna, como a Rede Celebra, por exemplo.

Ora, temos visto muitos absurdos no campo litúrgico que não estão recebendo a devida orientação. Multiplicam-se as Missas de “Cura e Libertação”, “Cercos de Jericó”, adorações eucarísticas fora do contexto específico no qual devem ser realizadas, e pouco é feito para orientar o povo, com exceções de iniciativas isoladas de alguns bispos e presbíteros.

Carecemos de uma iniciação cristã na qual a participação efetiva na liturgia não seja vista como uma mera obrigação doutrinária, mas como um caminho espiritual do católico. A grande maioria ainda “assiste” Missa. Boa parte dos padres ainda fala que vão “celebrar” a Missa, enquanto, na verdade, é todo povo quem celebra, o presbítero ou bispo preside a celebração eucarística.

Divulga-se cada vez mais uma ideia de “missa show”, onde o fiel deve sair contente, mas não necessariamente participante do mistério pascal celebrado no domingo. E nesta direção, as TVS de inspiração católica têm atrapalhado bastante.  Há uma história real de um pai que participava da Missa em horário diferente dos filhos. Quando os filhos chegavam ele perguntava: “qual foi o Evangelho de hoje e que parte da homilia do padre lhe tocou mais”? Quantos de nós, depois da celebração, somos capazes de responder tais perguntas? E se estendermos para as três leituras, ou somente o Salmo? E para complicar mais, é bom lembrar que existem homilias muito ruins. Cremos que muitos não leram, na “Alegria do Evangelho” (EG), a parte que o Papa Francisco fala das homilias.

O trabalho evangelizador vem se reduzindo à participação de ritos religiosos sem a devida relação entre fé e vida. Há uma espécie de rendição, por baixo, do verdadeiro sentimento religioso do povo, buscando aquilo que agrada. E não estamos aqui falando sequer de uma espiritualidade mais comprometida com os desafios da realidade social, como é comum encontrar nas CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), mas do tripé indicado pelo Papa Bento XVI na encíclica “Deus é Amor”: “A natureza íntima da Igreja exprime-se num tríplice dever: anúncio da Palavra (kerygma-martyria), celebração dos Sacramentos (leiturgia), serviço da caridade (diakonia)”

Praticamente, se tem reduzido o trabalho pastoral à liturgia, mas uma liturgia que não é mistagógica, isto é, uma iniciação ao mistério. Procuram-se símbolos de ostentação e não de fidelidade ao Caminho de Jesus. Ora, nada mais sem fundamento bíblico e teológico como afirmar a necessidade de objetos litúrgicos de valor expressivo, cálice de ouro, por exemplo, porque o louvor a Deus exige.  Ora, quem exige é “Baal” e não o Deus de Jesus Cristo. Sem falar, como disse o Papa Francisco, no excesso das “rendas da vovó”.

Ora, parece-nos muito urgente que seja retomado um grande processo de iniciação litúrgica. Uma nova edição do Missal é importante? Sem dúvida. Mas de que adianta um Missal muito bom diante de uma fé infantilizada?

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