A Igreja está no mundo, da mesma forma que o mundo está na Igreja. A relação das realidades eclesiais e culturais é estreita e, muitas vezes se confundem. Assim, está sempre presente a possibilidade de uma dessas realidades influenciar na outra, positiva ou negativamente. Em nossa sociedade do desenvolvimento, do consumo e da eficiência, é inegável que esses valores culturais estejam presentes no âmbito eclesial.
No contexto da pandemia do Covid-19, os valores da cultura estão abalados. A palavra mais comum no atual contexto é: “Reinventar”; reinventar nosso modo de viver; reinventar nosso modo de trabalhar; reinventar nosso modo de estudar; reinventar nosso modo de se relacionar; e, reinventar a forma de viver a fé. Embora o discurso seja esse, instintivamente, buscamos retornar a todas essas coisas como elas eram antes.
Na Igreja para muitos de nós a vitalidade da comunidade era medida pela quantidade de ações que realizava, a quantidade de pessoas que mobilizava e quantas realizações efetivava. É a lógica do fazer em detrimento a do ser. Quantas pastorais e movimentos temos? Quantas pessoas veem a missa? Quanto dízimo, ofertas e doações arrecadamos? Quantos templos, salões e centros catequéticos construímos? Nessa lógica, que inegavelmente assumimos, da cultura de nosso tempo, podemos dizer que estamos paralisados.
O essencial cristão
Tantas vezes pregamos que o cristianismo é uma vocação e não uma profissão, que o essencial é a fé, o amor a Deus e ao próximo. Como pessoas de fé somos chamados a discernir os sinais dos tempos, perguntar: o que o Senhor quer nos dizer? Que significam os acontecimentos históricos para nossa vida e nossa fé? E como povo da esperança, somos chamados a buscar no horizonte a Luz do Senhor para guiar-nos.
Creio que a Pandemia é de alguma forma um impulso, forçado, a nos voltarmos ao essencial cristão. Que está não nas coisas que fazemos, mas naquilo que somos: “Estamos no mundo, sem ser do mundo”. Assim, o cristianismo é chamado a ser sal e luz, como um testemunho do bem, da justiça, da verdade e da fraternidade. No tempo em que não importa tudo que fazemos, tem que irradiar para o mundo o que somos, discípulos missionários de Jesus. O essencial dos cristãos nas primeiras comunidades é expresso nos Atos dos Apóstolos:
“Eles eram perseverantes no ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna, na fração do pão e nas orações. Apossava-se de todos o temor, e pelos apóstolos realizavam-se numerosos prodígios e sinais. Todos os que abraçavam a fé, viviam unidos e possuíam tudo em comum”.
O cristão essencial
Nesses tempos somos desafiados, não a nos reinventar, mas recuperar o essencial, o fundamental do ser cristão. Creio que duas coisas nos interpelam no essencial do cristão. Quando Jesus na última ceia instituí a eucaristia e o sacerdócio, deu a Igreja dois dons especiais: a Comunhão e Serviço. Muitas vezes reduzimos a comunhão ao âmbito sacramental e nos esquecemos, da estreita ligação desses dois elementos no essencial cristão. Comungar é servir, servir é entrar em comunhão.
O cristão essencial é o que não negligencia nenhum desses aspectos em sua vida. Comunga e serve. De maneira concreta, entendo, que nos tempos que vivemos ser pessoas de comunhão e serviço é o essencial. Não pode nos faltar a comunhão, sacramental, espiritual, eclesial, de fé. Não podemos nos furtar do serviço, da diaconia, da caridade, da partilha. Ou seja, não pode nos faltar a eucaristia e a diaconia. Podemos adiar todas as ações eclesiais, pastorais, movimentos, reuniões, encontros, celebrações. Mas, não podemos deixar de socorrer-servir nossos irmãos. Lembremos como o Senhor, mesmo nos disse, que será nosso julgamento:
“eu tive fome… tive sede… era migrante… estava nu… estava doente… estava na prisão…”
O Senhor que vê o coração nos julgará, não pelo que fazemos, mas pelo que somos: Que sejamos homens e mulheres de comunhão e serviço.
Pe. Fabio Antunes do Nascimento
Diocese de Coxim