“Um dos maiores presentes do Sínodo é saber que todos somos convidados para um diálogo aberto”, afirma jovem wapichana da Guiana

Por Luis Miguel Modino

A Rede Eclesial Pan Amazônia cada vez mais está ganhando mais importância na vida dos povos amazônicos, pois dá a possibilidade de “estar interligados”, tal como foi reconhecido por Leah Casimero, jovem indígena wapichana da Guiana, um país com uma população amplamente dispersa, sobretudo no interior.

Como reconhecido pela jovem, que atualmente é coordenadora de programa piloto de educação bilíngue, que pela primeira vez está sendo articulado pelos líderes das comunidades indígenas com o Ministério da Educação, a REPAM ajuda a ser “bem conscientes da realidade”, da Pan Amazônia e do próprio país, o que é descoberto nas reuniões preparatórias do Sínodo para a Amazônia, afirmando que “um dos maiores presentes neste momento de preparação para o Sínodo é saber que todos nós, membros da Igreja, somos convidados a um diálogo aberto entre todos “.

Leah Casimero, que mora em Aishalton, reconhece “a perda de nossa cultura” como um dos problemas dos povos indígenas, algo que está sendo revertido com a ajuda dos jesuítas. Ela valoriza o fato de que tem sido introduzido sua língua, canções, danças e roupas na vida da Igreja Católica, pedindo-a para mantê-los juntos, chamá-los para conhecer as lutas de outros povos e se articular em rede. Nesse sentido, ela vê o Papa Francisco como “uma grande esperança para nós”, que está dando a eles uma oportunidade com o Sínodo para levantar suas vozes e dizer o que precisam, para o que eles lutam.

O que tem significado a Rede Eclesial Pan Amazônica na Guiana?

Uma das coisas que me chamou a atenção desde que conheci a REPAM é o fato de ser uma rede e estar interconectada. Como você sabe, na Guiana todos nós estamos distante, vivemos separado, e o sentido de rede nos permite nos concebermos em conjunto, as realidades que poderiam ser mais distante, como o litoral, com as realidades da Amazônia, os povos indígenas que estão nessa região.

Uma das coisas que tem sido um aprendizado é o sentido de Igreja, de saber o que é a Igreja e também o fato de estarmos interconectados pela rede nos permite saber o que os outros estão vivendo e eles sabem o que estamos vivendo. Então, nos mantermos interconectados e muito conscientes da realidade. No evento que tivemos em Manaus de REPAM juventudes, foi muito interessante para nós, como participantes de Guiana, porque nos outros países dava para perceber muito que estavam vindo de países onde a REPAM já havia sido trabalhada, tinha secretarias específicas e, de alguma forma, eles já sabiam um pouco mais sobre o processo. Para nós, como a Guiana, foi a primeira vez que participamos de um evento desse tipo.

Quando voltamos deste encontro nos sentimos muito encorajados a fortalecer nossa rede no país e ter o serviço de secretariado que pode nos ajudar a ter uma pessoa de referência e um lugar para ir quando precisamos de algo. Mas acima de tudo, a sensação de estar no mesmo nível ou com o percurso que os outros países já tiveram. Muitos estão ouvindo falar sobre a REPAM pela primeira vez, assim como nós, que estivemos mais próximos do processo da REPAM Juventudes, ouvimos esse nome no ano passado. As pessoas estão tendo uma noção, pelo menos inicialmente, mas já é um ir descobrindo o que a rede significa, o que está acontecendo com a Igreja na Amazônia e isso já é muito.

Em um país onde os católicos são uma pequena minoria, a rede é de fundamental importância. Como você acha que esse trabalho pode ser estruturado e como pode o Sínodo para a Amazônia influenciar o futuro trabalho da Igreja Católica na Guiana?

Desde que começamos este processo de preparação para o Sínodo, e tudo o que está acontecendo em nossas regiões, pois estamos em regiões da Guiana que estão muito distantes, no norte e no sul, onde não somos muito conscientes uns dos outros, os encontros em preparação para o Sínodo são oportunidades de estar juntos. Uma das coisas importantes é tornar-se consciente de nossa presença como povos indígenas destas regiões, que são consideradas o interior de Guiana, e a interação com outros membros da Igreja de outras regiões, que não têm necessariamente a presença de povos indígenas, como a região do litoral. Isso nos fez ter uma consciência muito maior do que está acontecendo no país.

Um dos maiores presentes neste tempo de preparação para o Sínodo é saber que todos nós, membros da Igreja, somos convidados para um diálogo aberto entre todos. Temos experimentado nas reuniões que a nossa voz, além da Igreja concebida como bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas, temos a capacidade de dar a nossa opinião sobre o assunto, sabendo que o Papa Francisco está dando prioridade à escuta de nós, aos povos indígenas no Sínodo.

Quais são os principais problemas que afetam os povos indígenas na Guiana?

Uma das principais questões é a perda de nossa cultura e alguns problemas que estão relacionados a isso, como a educação, mas principalmente tudo está relacionado à perda de nossa cultura.

Como a Igreja Católica está ajudando os povos indígenas a cuidar da cultura, línguas e tradições?

Estamos cientes da relação histórica da Igreja com os povos indígenas desde o início, que foi um pouco rígida, querendo impor um estilo de educação e um modelo de aprendizagem. A parte positiva do processo foi que temos a oportunidade de experimentar agora uma experiência piloto, no sul de Rupununi, onde estamos promovendo a educação bilíngue. Para isso tivemos a ajuda, também o apoio econômico, da Igreja, dos jesuítas.

Quando vivenciarmos este projeto piloto, poderemos compartilhar nossa experiência com outras regiões da Amazônia da Guiana, onde existem comunidades indígenas. Estamos convencidos de que este apoio, fortalecendo a educação holística, nos fortalecerá como povos indígenas, especialmente fortalecendo nossa cultura. Isso no que tem sido a colaboração no assunto da educação.

Outra questão em que também sentimos que tem havido muito apoio e acompanhamento para fortalecer, tem sido na participação das cerimônias na Igreja. Podemos participar com nossas músicas, nossas danças, nossas roupas e a Igreja nos encoraja a retomar, a fortalecer, a usar nossa cultura para participar desses ritos. Uma das coisas que está acontecendo é que os padres estão indo para as nossas comunidades e já elaboramos o ritual da missa em nossa própria língua. Isso ajudou os sacerdotes a celebrar a missa em nossa língua. Isso nos faz sentir muito unidos e levados em conta.

Existem povos indígenas na Guiana que também moram no Brasil e na Venezuela, como a REPAM pode ajudar a tomar consciência das lutas comuns, não apenas no nível dos países, mas no nível pan-amazônico?

Em primeiro lugar, para confirmar o que eu disse antes, na Guiana vivemos muito isolados de muitas maneiras, vivemos em uma área muito rural, que não tem grandes cidades, que não tem meios de comunicação que nos permitam saber o que está acontecendo do outro lado das fronteiras, no Brasil, na Venezuela, é um pouco mais difícil estar ciente de tudo isso. Como Igreja, também experimentamos essa mesma sensação, são visitas periódicas do bispo, dos sacerdotes e vivemos em uma situação em que somos mais conscientes de nós mesmos.

Uma das coisas que é importante que a Igreja pode fazer é nos manter unidos, nos convocar juntos para conhecer as lutas dos outros povos. Há um fator que ajudaria muito, é o da tecnologia, é muito caro se mobilizar, como fizemos até agora, mas, na verdade, se tivermos mais informações do que o que está acontecendo em outros lugares, teremos mais consciência nesse sentido mais regional.

Compartilhar as informações do que está acontecendo em outros lugares, das experiências já vividas, os pontos fortes e fracos dessas experiências, nos permitirá nos articularmos mais em rede e também ter mais elementos para caminhar na direção onde devemos ir, com as informações necessárias. Isso nos encherá de força e nos dará esperança para confirmar que não estamos sozinhos nessa luta comum.

O papa Francisco é alguém que está despertando muito carinho entre os povos indígenas da Amazônia. O que o Papa Francisco significa para você como católica e indígena?

Desde que ele foi nomeado Papa, tem sido uma grande esperança para nós, desde que começou tivemos a sensação de que ele era um papa diferente, que ele estava fazendo as coisas de uma maneira diferente. Percebemos alguns gestos que ele teve, por exemplo, quando pediu a bênção do povo, não tanto para dar, como todos esperavam, mas para recebê-la. São detalhes simbólicos que nos mostraram que é uma nova maneira de fazer as coisas e nos deu uma luz com algo que não aconteceu há muito tempo.

O Papa está nos dando essa oportunidade agora. Os povos indígenas da região amazônica da Guiana são tímidos, não temos facilidade em dizer o que pensamos, mas é porque sentimos que ninguém está nos escutando. O Papa está dando um novo significado a isso, ele está dizendo, sim, levantem sua voz, digam o que vocês precisam, para o que vocês estão lutando, porque eu e a Igreja estamos aqui para ouvir. É uma nova oportunidade de falar, de levantar a voz, de ser ouvidos também, algo que, ao mesmo tempo, nos dá muita esperança.

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