“Sinto pena de todas as crianças, que são sagradas sem distinção de nacionalidade ou de fé, que sofrem e morrem. Que pagam porque outros não souberam encontrar os caminhos para a paz”
Liliana Sagre (para a Comunidade Judaica)
Estamos chegando pertinho do Natal, ao qual chamamos de tempo de esperança, de renovação, de vida nova, dentre tantas outras expressões que costumeiramente, nos enchem o coração. Mas neste ano, existe uma sensação estranha no ar. Alguma coisa parece não “bater” com estas expressões.
Estamos diante de uma guerra, que nos confronta com Aquele que esperamos nascer outra vez. Uma guerra que já ceifou milhares de vidas, e dentre essas vidas, segundo a organização internacional Save the Children, mais de 3.257 crianças já perderam suas vidas. Poderíamos nos perguntar: por que só agora essa guerra nos impacta, se há décadas acompanhamos os conflitos entre países, que acabam em guerras, como a recente e ainda em curso, guerra da Rússia contra a Ucrânia? E o que dizer das milhares de mortes de nossas crianças brasileiras por falta de cuidado sanitário, como é o caso das crianças indígenas, ou as vítimas de balas perdidas nas periferias e áreas urbanas de nosso país? Ou vítimas da fome, num país que tanto produz? E o que dizer da infância roubada de tantas vítimas da violência doméstica?
Essa realidade nos leva a crer que o mundo tornou-se um lugar perigoso demais para nossas crianças, e que elas não estão a salvo em lugar nenhum. Isso me reportou a uma prática usada no Antigo Testamento para apaziguar a ira dos deuses. A estes deuses quando ficavam irados, eram lhes oferecidas crianças, vítimas inocentes, antes que sua ira devorasse a nação inteira. Jericó é um exemplo disso. A cidade foi construída ao preço de duas crianças enterradas debaixo dela, para apaziguar a ira dos deuses. Mas até quando inocentes terão que pagar com a própria vida, pelos desmandos insanos daqueles que se colocam como deuses e se dizem donos do mundo? Ou aos que a senadora Liliana Sagre se refere: aqueles que não conseguem encontrar um caminho de paz.
E novamente será natal! E novamente Belém, será nossa referência para o nascimento do Menino Deus! Contudo, não podemos camuflar essa realidade tão cruel, celebrando e festejando apenas para cumprir um ritual litúrgico, como se tudo fossem luzes, brilhos e cantos. Este natal terá que ser diferente. Nele teremos que fazer memória das vidas tão precocemente arrancadas das “Beléns” do mundo.
E para que o Natal retome seu sentido, quem sabe possamos cuidar das crianças a começar pelas nossas comunidades, com o mesmo carinho que temos com o Menino Jesus na manjedoura. Isso implica fazermos alguns movimentos, para os quais algumas questões são importantes: Como vivem as crianças da minha comunidade? Que espaços de vivência elas têm na catequese, no lazer, na família, nos grupos bíblicos? Temos acompanhado os espaços de Garantias de Direitos para crianças e adolescentes, como os Conselhos Municipais, Estaduais e o CONANDA em âmbito nacional? Qual a nossa relação com os Conselhos Tutelares? Estamos envolvidos/as com alguma luta em defesa da vida das crianças e adolescentes? Como acompanhamos a saúde e a educação da meninada da comunidade? É assim que vamos enfrentar esses deuses!
Que neste natal, corra em nossas veias a força da solidariedade com as crianças do mundo inteiro, para que Deus salve as crianças onde Ele já faz morada.