É teologicamente necessário sempre repensarmos nossas idéias sobre Deus, isto é, a representação que fazemos Dele; quase sempre para esconder nossos interesses escusos. Em que Deus você crê? Em que Deus você seria incapaz de crer?
Baseado na Bíblia podemos, sim, falar de um “DEUS ACIMA DE TODOS”, enquanto Altíssimo ou que “habita em luz inacessível, etc. Contudo, também podemos falar do “DEUS ACIMA DE TODOS”, como um “deus” de coturno (a imagem e semelhança do suposto crente) que serve como sinistro álibi para justificar as mais escabrosas atrocidades (físicas e simbólicas). Para o teólogo jesuíta Pedro Trigo, “mais importante que saber que Deus existe é perguntarmos por nossa idéia sobre Ele”.
Escreve Dom Pedro Casaldáliga: “A pergunta pelo Deus cristão é a pergunta mais radical que a própria Igreja pode se fazer. Trata-se de saber se o Deus que adoramos é realmente o Deus de Jesus ou um ídolo mascarado”. E citando Pedro Trigo adverte: ” Não se deve considerar como suposto que nosso Deus é o Deus da Vida que se manifesta em Jesus. É possível participar da missa diariamente, estar diante do Santíssimo Sacramento em adoração perpétua ou exercer a função de pároco, provincial ou bispo e, contudo, manejar a imagem de Deus que não é o Pai de Jesus. Pode ser muito bem o Deus de uma instituição, de uma cultura ou PROJEÇÃO DE DESEJOS INFANTIS. Temos de discernir constantemente para que nosso Deus não seja o Deus de realidades humanas sacralizadas”. Nossa representação de Deus tem muito do que somos, pensamos e queremos, ainda que inconscientemente.
É importante pensar (se isso ainda for possível) que o Deus revelado por Jesus não se mostrou “ACIMA”, mas “CONOSCO” (=EMANUEL). E, como se não bastasse, o Deus de Jesus se fez ABAIXO DE TODOS e TODAS. Tomou o último lugar. Não se apegando a Si, apaixonadamente, desceu, desceu e desceu…até a mansão dos mortos! Papa Francisco não cansa de falar nas homilias que Deus, porque nos AMA, “faz história conosco”, “caminha conosco”, “não é um Deus abstrato”, etc. E o próprio Jesus ao SUBIR não disse que estaria ACIMA, mas conosco e dentro de nós (todos os dias!). Nisso reside o mistério do NATAL: “O Verbo se fez carne e habitou entre NÓS!”. “ENTRE”, não “sobre”.
Crendo, pois, num Deus que se revela assim, na “loucura e no escândalo da cruz”(de descida em descida), tão escancaradamente próximo e dentro de nós, é, no mínimo, perigoso pensar, acriticamente, num “Deus acima de todos”.
TERIA ESSE DEUS COTURNO?
Como disse Jesus:”Tirem vocês mesmos a própria conclusão!”.
Padre Gegê (Mestre em Teologia – PUC/RJ e Doutorando em Ciência da Religião – PUC/SP)
Foto: Província Santa Cruz