Por Luis Miguel Modino
O Sínodo para a Amazônia é um processo que acontece em diferentes etapas. Nestas semanas anteriores à assembleia sinodal, que se realizará no Vaticano de 6 a 27 de outubro, os Padres Sinodais, juntamente com os representantes da Igreja da Amazônia, estão realizando encontros nos quais está sendo trabalhado o Instrumentum Laboris.
No Brasil, este encontro de preparação acontece em Belém, onde cerca de 120 participantes, entre bispos, padres, religiosas e religiosos, leigas e leigos, estão reunidos de 28 a 30 de agosto. O encontro ocorre em um contexto em que, como reconheceu o cardeal Cláudio Hummes, relator do Sínodo para a Amazônia, “cada vez mais sentimos a importância do momento, o mundo está se envolvendo e reconhecendo a importância da Amazônia”. Então, vemos que este Sínodo “está se tornando algo seguido mundialmente”.
É verdade que existem “vozes que tem medo, interesses, que se sentem ameaçados”, reconhece o Cardeal Hummes, mas não é menos verdade que o realmente importante deste momento é que “os gritos do povo estão sendo escutados e recolhidos” e a necessidade de, como Igreja “estar próxima do povo”, afirma o Presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM, para quem “o processo de escuta sinodal foi algo extraordinário, o povo se sentiu envolvido, dignificado, participantes deste processo”.
O cardeal brasileiro insistiu que o Papa Francisco quer ouvir as mulheres, que, como ele reconhece abertamente, “têm um papel destacado nas comunidades da Amazônia”. Segundo alguns rumores, espera-se uma presença proeminente de mulheres na assembleia sinodal, excedendo o número de sínodos anteriores. Ao mesmo tempo, ele abordou algumas das preocupações do Papa Francisco em referência à região, já expressadas no encontro com os bispos por ocasião da Jornada Mundial da Juventude de 2013, no Brasil, e que até já aparecem no Documento de Aparecida, que não podemos esquecer que o então cardeal Bergoglio foi seu relator.
Nesse sentido, vale ressaltar que Francisco considera a Amazônia um teste decisivo para o futuro, por isso a Igreja não pode perdê-la. Para isso é preciso revitalizar a Igreja na Amazônia, consolidar o rosto indígena e amazônico, formar um clero indígena, passar de uma Igreja que visita para uma Igreja que está presente. Portanto, o Sínodo, como reconhece o Cardeal Hummes, retomando as ideias do Papa, “é caminhar juntos para buscar a comunhão, não é um parlamento”, para o qual é essencial “respeitar e reconhecer a riqueza das diferenças”.
Como reconheceu o Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, Dom Walmor Oliveira, o Sínodo para a Amazônia é “uma experiência importante para a nossa Igreja no Brasil e nos banhar de Amazônia”, que em sua opinião tem que “abrir o coração de nossa Igreja e sociedade para ajudar na compreensão do que será tratado na assembleia sinodal e será incluído na exortação pós-sinodal”. Nessa perspectiva, o presidente da CNBB reconheceu que “o Sínodo é uma possibilidade de sair da inércia, uma graça de Deus para um novo tempo, um novo caminho”. Não podemos esquecer, segundo ele, que “evangelizar tem a ver com a saúde, com uma nova ordem social e política, com uma profunda esperança, e o Sínodo para a Amazônia nos dá essa oportunidade”.
Um dos desafios deste processo sinodal, reconhecido por Cristiane Murray, subdiretora da Sala de Imprensa da Santa Sé, que nos últimos tempos trabalhou na Secretaria do Sínodo, é “comunicar ao mundo, à sociedade civil, à importância da presença da Igreja na Amazônia”, sendo o Sínodo para a Amazônia um momento de singular importância para dar a conhecer “o que a Igreja faz na Amazônia e o que ela pode fazer”. Nessa mesma perspectiva, o pastor luterano Inácio Lemke, do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil – CONIC, ressaltou que este é um momento em que “Deus está chamando os líderes das Igrejas para serem vozes que defendem a casa comum”.
Em seu discurso, José Oscar Beozzo, um dos grandes estudiosos do Concílio Vaticano II, começou afirmando a necessidade de profecia na Igreja da Amazônia e, para isso, citou as palavras de Dom Pedro Casaldáliga, que definiu como a primeira missão do bispo “ser profeta, ser a voz dos que não têm voz”. Mostrando a relação entre o Vaticano II e os sínodos dos bispos, ele enfatizou a importância da colegialidade. Ao mesmo tempo, ele insistiu na missionariedade, porque “o cuidado de anunciar o Evangelho é a atividade mais sagrada da Igreja”.
Em consonância com o que foi afirmado pelo cardeal Hummes, estamos em um âmbito em que se pretende alcançar toda a humanidade. Os dois únicos momentos em que os papas se dirigiram a toda a humanidade, superando as fronteiras eclesiásticas, estiveram na crise dos mísseis, nos anos 60, quando João XXIII se dirigiu a todos os homens e mulheres de boa vontade, algo repetido na Encíclica Laudato Si, que visa responder à crise socioambiental, algo que continuará no Sínodo para a Amazônia, recentemente definido pelo Papa Francisco como filho da Laudato Si.
A reunião retomou os resultados do processo de escuta, resultado do documento preparatório, no qual, como afirmou Zenildo Lima, “não se pretendia apresentar um conteúdo e sim um método com o qual queremos fazer uma reinterpretação da realidade a partir de novas categorias e cosmovisões”. De fato, no processo de escuta havia uma grande variedade de interlocutores, segundo o padre Zenildo, as assembleias territoriais foram “um grande passo no caminho do Sínodo, reunindo o clamor da base, o povo se sentiu ouvido”. Foi um tempo em que surgiram grandes questões, e que faz com que não se possa “perder a vitalidade e o espírito de escuta, é preciso salvaguardar a sua força”, apesar de reconhecer que a dimensão ecológica tem muito mais presença que a eclesiológica.
Com foco no Instrumentum Laboris, que será o centro das discussões ao longo dos dias, Monsenhor Raimundo Possidônio Carrera da Mata, um dos grandes historiadores da Igreja na Amazônia, afirmou ao apresentar a primeira parte do documento, que o Sínodo para a Amazônia “é um ponto de chegada, já que muitos dos conceitos presentes no Instrumentum Laboris são realidades já vividas”. Isso ajuda a apoiar o fato de que “não se pode perder a Amazônia como sujeito de todo esse processo”, uma afirmação feita por Dom Mário Antônio da Silva, bispo de Roraima e segundo vice-presidente do episcopado brasileiro.
A reflexão dos participantes sem dúvida enriquecerá um processo que, os quase sessenta bispos brasileiros que serão padres sinodais, levarão a uma assembleia em que, a partir de uma visão de pan-amazônica, quer fazer realidade novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral.