O jornal Folha de Anapu publicou na madrugada de hoje, uma reportagem com o histórico de lutas em defesa dos direitos dos pequenos produtores que vivem historicamente sob ameaça no estado do Pará. Essa longa história de luta, vitimou a Irmã Dorothy, em 2005.
Com a resistência e continuidade do Pe. Amaro Lopes, ele se tornau mais uma vítima do grande latifúndio, sendo criminalizado sem provas.
Segue a reportagem na íntegra!
Ontem, 27 de março de 2018, ao se dirigir ao terminal rodoviário com o intuito de buscar padre Bento que estava de viagem, o padre José Amaro Lopes, da prelazia do Xingu, pároco de Anapu, foi abordado por cerca de 21 policiais e conduzido até a sua residência para busca e apreensão de documentos e objetos que o comprometessem. Ao final da operação tiraram fotografias no centro da sala da residência paroquial, semelhante àquelas que os times de futebol fazem após uma vitória. Padre Amaro foi conduzido até a delegacia da superintendência regional do Xingu em Altamira onde prestou depoimento e sofreu prisão preventiva.
Padre Amaro desde que foi ungido sacerdote há cerca de 18 anos exerceu seu ministério em Anapu. Trabalhou ao lado de irmã Dorothy Stang que foi assassinada em fevereiro de 2005 por conta de fazendeiros grileiros. Padre Amaro deu prosseguimento ao trabalho de Dorothy, assumindo a Comissão Pastoral da Terra-CPT e realizando um trabalho baseado no princípio doutrinal e pastoral da “opção preferencial pelos pobres”.
Tudo começou quando com a imigração de pessoas para a Amazônia em busca de melhores condições de sobrevivência por volta da década de 70. Eram pessoas provenientes de outras regiões do país que vendiam seus poucos bens na esperança de encontrar no Pará terras para trabalhar e sustentar suas famílias. Ao chegar na região, compravam pequenas porções de terra, mas eram em seguida impedidos de trabalhar por pistoleiros. As famílias eram despejados às margens da rodovia Transamazônica. Ao ver toda essa injustiça, a jovem Dorothy Stang pediu ao bispo Dom Erwing que queria morar no pequeno povoado de Anapu. Dada a autorização, a missionária começou a orientar o povo e a defender junto aos poderes públicos o interesse dos desvalidos que tinham perdido todos os seus bens e estavam sem condições nem mesmo de voltar para a terra natal. E assim Dorothy permaneceu em Anapu trabalhando em defesa dos pobres até 12 de fevereiro de 2005, ano de seu assassinato.
A prisão do padre, coincide com um boato de que a gleba 44 seria em breve liberada em favor dos colonos e em prejuízo dos pretensos donos. Coincide também com a indiciamento de clérigos de Formosa por corrupção. Outro fato interessante é que enquanto os policiais da TV encobrem os rostos com máscaras ao realizar uma operação de busca e apreensão, os policias que abordaram o padre fizeram questão de realizar uma fotografia coletiva na residência paroquial. Além disso, não realizaram qualquer abordagem ao padre Bento, recém-chegado em Anapu que convive na mesma residência que padre Amaro. Mês antes da prisão do sacerdote, prenderam o motorista acusado como individuo de alta periculosidade e libertado após conselho de abandonar o padre.
A partir destas constatações, levanta-se naturalmente as seguintes hipóteses:
1. A prisão do padre Amaro é resultante do desejo e da influência da união dos fazendeiros da região sobre o poder judiciário e teve esperança aumentada com o escândalo de Formosa;
2. A delegacia de polícia envolvida no caso pode estar recebendo propina dos fazendeiros e a fotografia coletiva seria uma forma de prestar conta aos fazendeiros acerca da empreitada;
3. A prisão preventiva tem caráter investigativo e não flagrante, o que abre espaço à ideia de que qualquer eventual falha humana do padre seria uma boa desculpa para prendê-lo para saciar a sede de vingança das supostas vítimas latifundiárias;
4. Os fazendeiros temem assassinar o clérigo e sofrer represálias semelhantes às aplicadas contra os mandantes do assassinato de Dorothy, por isso utilizam os próprios órgãos oficiais para faze-lo abandonar a região ou calar-se de vez;
5. Havia uma falsa concepção de que o motorista seria na verdade um pistoleiro disfarçado e o temiam, a prisão do mesmo seria uma ótima maneira de intimidá-lo e assim encontrar uma maneira mais cômoda de atingir de alguma forma o verdadeiro alvo que seria padre Amaro.
É fato que os grileiros de grandes latifúndios têm forte oposição ao trabalho de padre Amaro por perceber nele uma ameaça às suas pretensas propriedades rurais que na verdade pertencem à união federativa dos estados do Brasil. Aos supostos proprietários de latifúndios foi dada pelo governo brasileiro no início da povoação da Amazônia apenas uma autorização de exploração e cultivo nas áreas florestais em vista do desenvolvimento regional e não da propriedade das terras. Por isso, hoje há deixas para que os colonos possam entrar com ação na justiça e pleitear a distribuição das terras públicas através dos órgãos competentes, como o INCRA e a justiça. Neste sentido, a CPT pode dar o seu parecer perante a justiça, e nisto consiste oficialmente o trabalho de padre Amaro que muito desagrada aos latifundiaristas.
Publicado pelo Jornal Folha de Anapu, em 28 de março de 2018