Práticas de “anti” Sinodalidade

“A sinodalidade é a expressão do modus vivendi et operandi da Igreja”.

Na contra mão do que nos ensinam as primeiras comunidades cristãs e do que nos pede o Papa Francisco, muitos espaços já consagrados pela prática da comunhão, participação e missão, têm sido desfigurados por algumas dioceses e paróquias numa tentativa de retomar a “Igreja de conservação” e negar a eclesiologia conciliar que define a Igreja como Povo de Deus.

Sempre é bom lembrar que por sinodalidade, compreende-se o jeito de uma Igreja ser. É seu “mudus vivendi et operandi”. É seu jeito de viver e atuar e que ganha força com a afirmação de Francisco de que a sinodalidade é uma dimensão constitutiva da Igreja. É da sua natureza caminhar juntos. Os momentos sinodais por sua vez, são aqueles em que a Igreja se reúne, se encontra para refletir, pensar, avaliar e planejar sua caminhada. E são espaços de intensa comunhão, participação e missão. 

Normalmente estes momentos sinodais, dentre outros, se dão nas Assembleias e Conselhos de Pastoral organizados em âmbitos diocesanos, paroquiais e comunitários, como lugares privilegiados e legítimos da prática da sinodalidade para a Igreja olhar para seu modus vivendi et operandi,  pensar e planejar sua caminhada. Ninguém deveria estar nestes espaços sem sentir-se “sujeito eclesial – Povo de Deus”. Isso seria negar a comunhão para a qual a Igreja é chamada.  

Esse tripé: comunhão, participação e missão, é que define a legitimidade desses espaços, como prática da sinodalidade. O Sínodo de 1985 reafirmou que a Igreja é Comunhão. A eclesiologia da Comunhão nos permite pensar a caminhada da Igreja a partir da unidade em Cristo cabeça, na pluralidade entre os membros do corpo, superando qualquer tentação de uniformidade. Nela somos chamados a dizer “nós decidimos”, em lugar do “eu decidi”. A Igreja comunhão se caracteriza como Igreja Povo de Deus. A Participação evoca um processo de participação ativa, integral, que só será realizado de forma autêntica se todo o Povo de Deus estiver envolvido nele, cada um/a segundo a sua função, carisma e vocação, para o bem da vida e da missão da Igreja. A Missão é antes de tudo, sentir-se chamado/a a ser discípulo/a missionário/a para ir ao encontro das pessoas na situação em que elas se encontram. A sinodalidade é para a missão, por isso vive, antes de levar e testemunhar o Evangelho. Não é uma missão individual. É missão da Igreja. 

Dado isso, é importante refletir sobre as práticas de “anti” sinodalidade que se têm evidenciado nos últimos tempos, inclusive, transformando estes espaços que consideramos legítimos lugares da vivência sinodal, como as Assembleias e os Conselhos dentre outros, em ambientes onde se consagra uma “ditadura” velada: agendas de reuniões vêm prontas sem consulta aos que delas devem participar; programações e planejamentos são feitos, sem consulta aos que as devem executar; avaliações são direcionadas aos aspectos unicamente “positivos”, impedindo que as comunidades façam um olhar crítico e profético diante da realidade. Não é diferente do enredo de lamentações vindas de lideranças leigas, denunciando um clericalismo reinante: “aqui quem manda sou eu”; “o `padre´ quer assim…”, ou ainda, “temos que ver se o padre vai deixar! Se o padre vai permitir! Se o padre vai concordar!”, “Se o padre vai gostar!”. São retratos de uma Igreja onde a vida está centrada e dependente da figura do padre, as lideranças não conseguem dar um passo à frente sem pedir permissão ao pároco, o que faz com que tanto as assembléias como os conselhos percam sua legitimidade. 

E o que dizer de algumas transferências de padres de uma paróquia para outra? Há uma verdadeira dificuldade de inculturação àquela realidade nova. Nem ao menos reúnem a comunidade para ouvir dela, como é seu jeito de organizar-se, ou, qual é o seu modus vivendi et operandi? Ao contrário, chegam negando e não reconhecendo a caminhada da comunidade e com ela, toda a sua história, lideranças… A primeira medida é a substituição de lideranças de algumas coordenações, sob pretextos de que precisam ter “pessoas de confiança” nesta nova gestão; na sequência, a reforma da casa paroquial para garantir maior privacidade ao padre… E pensar que muitas destas comunidades eclesiais já viveram a forte experiência da sinodalidade, nas quais as lideranças eram eleitas em assembleias, as decisões tomadas em conjunto nos Conselhos de Pastoral, as casas paroquiais, abertas ao povo… Uma igreja triste e envelhecida, essa que depende da vontade de um padre e não do conjunto do povo de Deus, para definir por qual caminho irá caminhar. Obviamente, não “caminha junto”. Portanto, não é uma igreja sinodal.  

Infelizmente essas práticas anti sinodais não se restringem a alguns padres. Bispos, leigos e leigas, religiosos/as, seminaristas também compõem o quadro dos que resistem à sinodalidade e lutam pela manutenção de uma igreja conservadora. E o fazem por medo e aversão a mudanças, por medo de perder poder e prestígio e por insegurança.   

É tempo de recuperar e fortalecer a prática da sinodalidade reafirmada no Concílio. Somos a Igreja Povo de Deus. Construir uma Igreja toda ela sinodal, é responsabilidade nossa também. Por isso, sigamos com Francisco que nos diz: “Penso ser esta realmente a melhor experiência que podemos viver: fazer parte de um povo em caminho, em caminho na história, juntos com o Senhor, que caminha no meio de nós“.

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