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Enfrentar a desigualdade social

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Em discurso no dia da posse, Lula disse que tínhamos de lutar contra a fome e contra a desigualdade. Esta posição é um passo à frente daquela que assumiu nos seus primeiros oito anos de governo (2003-2010). Naquele período, implementou políticas sociais que tiraram 30 milhões de pessoas da miséria, reduziram a pobreza e aumentaram a capacidade de consumo de amplas camadas da sociedade, graças ao Bolsa Família, sim, mas, sobretudo, graças ao aumento real do salário mínimo. E também à facilidade de acesso ao crédito para a população de renda mais baixa. Mas não reduziu a desigualdade social.

O Brasil não é um país pobre, é um país injusto. A frase é de Fernando Henrique Cardoso que, no entanto, não mudou este quadro. O Brasil tem uma riqueza imensa e recursos suficientes para alimentar toda a sua população. Mas tal riqueza, tais recursos, são apropriados por uma pequena parte da sociedade, a camada mais rica. 

Dois são os fatores principais que produzem esta desigualdade: nosso sistema tributário (impostos) e o sistema da dívida pública. O sistema tributário brasileiro é construído de tal forma que os pobres – a maioria – paga proporcionalmente mais que os ricos. Todo assalariado que ganhe acima de dois salários mínimos paga imposto na fonte. Graças ao governo Lula, a partir deste ano, 2023, quem ganha até 2 salários mínimos está isento. Logo no início de seu governo, em 1995, FHC extinguiu o imposto sobre lucros e dividendos de pessoas físicas: em outras palavras, reduziu os impostos pagos pelos ricos. 

No nosso sistema tributário, o peso dos impostos está no consumo, o que faz com que os pobres, mesmo aqueles que não pagam na fonte, paguem imposto sobre o consumo – sobre o arroz, o feijão, o café, o trigo… Nos países desenvolvidos, o peso do imposto é sobre a renda e sobre o patrimônio (propriedade), de modo que os ricos pagam mais. As alíquotas variam de 5% a 45% (pouco mais ou pouco menos, conforme o país) e, quanto mais se ganha, mais se paga. No Brasil, a alíquota máxima é de 27,5%, atingindo mesmo quem ganha 5 salários mínimos e pesando menos sobre os mais ricos.

Da mesma forma, o imposto sobre a propriedade (sobre aqueles que têm propriedade), no Brasil, é relativamente baixo. Nos países desenvolvidos, o imposto sobre a herança é, em média, de 40%. No Brasil, é no máximo de 8%. No caso da propriedade rural, o imposto (ITR) é insignificante. Nós temos uma das maiores concentrações de propriedade rural do mundo e o imposto sobre estas enormes propriedades é muito baixo.

Não é verdade que somos um país que cobra muito imposto. Na verdade, a cobrança é muito mal distribuída e os ricos acabam pagando proporcionalmente muito menos que os demais. A legislação oferece várias brechas e os grandes empresários e banqueiros conseguem, através de seus especialistas, reduzir ou eliminar o que deveriam pagar. 

Em suma, o nosso sistema tributário, ao favorecer os mais ricos e penalizar a maioria, aumenta a desigualdade social.

Esta injustiça é reforçada pelo sistema da dívida pública: o maior gasto público do país é para pagar a dívida (juros e amortizações), quase metade de todo o orçamento. As despesas com a dívida (46% em 2022) são muito maiores que aquelas com saúde (3,4%) e com educação (2,7%). Os juros da dívida chegam a mais de 500 bilhões de reais por ano e são pagos pelo Estado ao 1% mais rico. Sobre este gasto, não há qualquer teto, qualquer limitação. Ao contrário, as regras fiscais são feitas para garantir recursos para esta despesa.

A confluência destas duas situações – o funcionamento do sistema tributário e o pagamento da dívida -, fazem com que haja uma transferência de renda da maioria da sociedade, a parte que ganha menos, para a pequena camada mais rica, que vai concentrando cada vez mais renda e riqueza. É uma injustiça evidente, que só faz aumentar cada vez mais a desigualdade.

Como resolver isto?

É preciso reformar o sistema tributário, para passar de regressivo a progressivo, isto é, para que os que ganham mais paguem mais, para que o peso da tributação esteja na renda e na propriedade e menos no consumo. Já foi feita a primeira parte da reforma tributária, que tratou da simplificação dos impostos sobre o consumo. A segunda parte da reforma tributária, que vai tratar da renda e do patrimônio, vai ser discutida pelo Congresso no segundo semestre. Os movimentos sociais, as organizações da sociedade civil, as pastorais sociais, têm de pressionar para que haja mais justiça social na cobrança dos impostos. Embora a camada mais rica seja pequena, tem muito poder de influência, apoio da grande mídia e não vai querer aumento nos impostos. 

Quanto à dívida pública, é preciso fazer uma auditoria da dívida, pois a maior parte desta dívida é indevida. Quem mais ganha no atual sistema são os banqueiros e os investidores financeiros, que não querem que haja auditoria. A única auditoria da dívida que o Brasil fez foi em 1931, há noventa anos, portanto; e, na ocasião, descobriu que 60% da dívida eram irregulares. Esta auditoria só será feita sob pressão da sociedade.

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