(Continua o tema do artigo anterior, da série de artigos sobre o Ser humano)
Para entender o funcionamento de uma sociedade histórica concreta, é sempre necessário fazer uma análise estrutural e conjuntural ao mesmo tempo.
Uma estrutura social (sócio-econômico-político-ecológico-cultural-religiosa) é entendida, por sua vez, como modo de produção. “O modo de produção é uma estrutura global, é uma combinação específica de três estruturas regionais, que aparecem como instâncias ou níveis: a estrutura econômica, a estrutura jurídico-política e a estrutura ideológica. A estrutura econômica forma a infraestrutura, enquanto a jurídico-política e a ideológica formam a superestrutura” (MENDONÇA, N. Domingues, O uso dos conceitos. Uma questão de interdisciplinariedade. Vozes, Petrópolis, 19852, p. 62).
Em sentido dialético (não mecanicista), o econômico (infraestrutura, base, modo de produção material: de bens materiais, de vida material) é – em última instância – sempre determinante (não o único determinante). Nem sempre, porém, detém (exerce) o papel dominante.
Às vezes, o jurídico-político ou o ideológico assumem a função de dominação. “Isso se dá pela interação dialética existente entre as várias estruturas, permitindo que umas ou outras se sobressaiam mais em determinados momentos históricos, e possam ser detectadas como as que dominam todo um período (…). Mas (…) a estrutura determinante, em última instância, continua sendo a infraestrutura econômica, e a ela cabe determinar os limites da superestrutura, pois, ao mesmo tempo que produz os bens materiais, reproduz as relações de produção específicas de cada modo de produção” (GEBRAN, P. Conceito de modo de produção. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1978, p. 14-15. Citado por: MENDONÇA, N. Domingues, o. c., p. 62).
Por exemplo, no modo de produção antigo, o político detém o papel dominante, que, por sua vez, é determinado pelo funcionamento da estrutura econômica própria deste modo de produção. No modo de produção feudal é o ideológico (sob forma de religioso – catolicismo) que domina, mas determinado também pelo funcionamento da estrutura econômica da época.
“O que está claro é que nem a Idade Média podia viver do catolicismo, nem o Mundo Antigo da política. Ao contrário, é a maneira como ganhavam a vida (como asseguravam a subsistência) que explica porque, numa época, desempenhava o papel principal a política e, na outra, o catolicismo” (MARX, K. O Capital. Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 19805, L. I, Vol. I, Cap. I, p. 91, Nota 32).
No modo de produção capitalista (e no próprio modo de produção do chamado socialismo real, que, na prática, é um capitalismo de Estado), o econômico detém não só um papel determinante, mas também dominante. O mundo moderno é, por assim dizer, dominado pelos interesses materiais.
A “determinação em última instância” ou a “supremacia última” do econômico em relação ao jurídico-político e ao ideológico não deve ser entendida de maneira reducionista, mecanicista e linear (visão economicista, determinismo econômico), mas dialética.
Elimina-se, assim, “a ideia de uma causalidade mecânica pela qual um nível, a economia, seria a causa e os outros níveis, as superestruturas, seus efeitos. A noção de ‘determinação em última instância’ permite substituir essa concepção por uma ideia dialética de causalidade, pela qual o fator em última instância determinante não exclui a determinação pelas superestruturas que, como causas secundárias, podem produzir efeitos e ‘reagir’ sobre a base” (LARRAIN, J. Base e Superestrutura. Em: Dicionário do Pensamento Marxista. Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 19882, p. 28).
Numa leitura – análise e interpretação – crítica e objetiva, é essa a nossa realidade.
(Continua no próximo artigo)
Compartilhando: para uma visão mais aprofundada e abrangente dos temas tratados, leia:
Editora Lutas Anticapital: Marília – SP, 2023 (p. 384)
editora@lutasanticapital.com.br
Marcos Sassatelli, Frade dominicano
Doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção – SP)
Professor aposentado de Filosofia da UFG
E-mail: mpsassatelli@uol.com.br
Goiânia, 12 de dezembro de 2023