Jesus foi assassinado em nome da lei (Jo 19,7). Morreu como maldito (Dt 21,23). Mas Deus o ressuscitou dos mortos, confirmando sua vida/missão e abrindo para nós um caminho autêntico e eficaz de salvação: lavar os pés uns dos outros (Jo 13,13-15); fazer-se próximo dos caídos (Lc 10, 25-37); socorrer os pequenos em suas necessidades (Mt 25, 31-46). Essa é a forma de participarmos de sua vida/missão (Jo 13,35) e, por ela, participamos da vida divina e manifestamos a glória de Deus no mundo.
A celebração do Mistério Pascal é inseparável da vida nova em Cristo Jesus. Não por acaso, os encontros com o Ressuscitado sempre geram um dinamismo missionário (Lc 24, 33-35; Jo 20,19-22). E não por acaso, a liturgia do Tempo Pascal retoma sempre as catequeses batismais: morrer com Cristo para o pecado e renascer com ele para uma vida nova (Rm 6,3-11; Cl 3,1-4). Mais que um rito que remete a um acontecimento passado, a Páscoa é a celebração da vitória de Jesus Cristo sobre o poder da morte que se manifesta na vida daqueles/as que, n’Ele, com Ele e como Ele, no poder do Espírito, passam no mundo fazendo o bem, curando, libertando (At 10,38). Como bem cantamos em nossas celebrações: “A Páscoa não é só hoje, a Páscoa é todo dia. Se eu levar o Cristo em minha vida, tudo será um eterno aleluia”. É a Páscoa nossa de cada dia…
O anúncio da Ressurreição do Senhor não pode ser um discurso abstrato/vazio. Nem pode se reduzir a mero desejo/voto de algo que não existe. Precisa ser concretizado em nossa vida. Temos que mostrar/comprovar em nossa vida e em nosso mundo sua vitória sobre o poder da morte e a força salvadora e recriadora do seu Espírito.
Ela se mostra e pode ser comprovada em muitas situações:
- na força (impotente, mas perseverante) com que tantas pessoas enfrentam enfermidade, abandono, solidão e até violência;
- no amor de tantas mães por seus filhos com deficiência, dependência química, vítima do tráfico e até agressivos com eles: impotente, mas nunca rendido;
- na dedicação cotidiana e silenciosa de tanta gente (familiares, vizinhos, amigos, conhecidos e até desconhecidos) a pessoas necessitadas e vulneráveis;
- nas mais diversas formas de diaconia aos pobres e necessitados exercidas por comunidades cristãs e grupos religiosos dos mais diversos;
- na indignação sentida e expressa de tanta gente contra toda forma de preconceito, discriminação e violência;
- na criatividade dos pobres para garantir o pão/sustento de cada dia e na solidariedade que ainda são capazes de realizar, repartindo o pouco que têm;
- na alegria (sorriso, humor, festa, música, dança etc.) sempre presente na vida do nosso povo, mesmo em meio às dificuldades e aos sofrimentos;
- nas muitas lutas e organizações populares: camponeses, indígenas, negros, sem teto, catadores de material reciclado, população em situação de rua, mulheres, população LGBTQIA+, pessoas com deficiência, idosos etc.;
- na resistência aos discursos de ódio, aos atentados contra os direitos humanos, à defesa da tortura, da pena de morte, da guerra etc.;
- na arte que expressa, canta e convoca ao respeito à vida humana, ao cultivo de relações fraternas e ao cuidado da Casa Comum;
- nas igrejas, grupos e movimentos religiosos que vivem e propagam a fraternidade, paz, a justiça e o cuidado da Casa Comum;
- e em tudo/todos que protege e promove a vida e a paz…
Tudo isso é sinal (limitado/ambíguo, mas real/eficaz) da vitória de Cristo Jesus sobre o poder da morte em nossa vida e em nosso mundo, ao mesmo tempo em que nos convoca a aspirar, buscar e alcançar essas coisas que manifestam e antecipam entre nós a vida nova do Ressuscitado: “Se ressuscitastes com Cristo, esforçai-vos por alcançar as coisas do alto” (Cl 3,1). Vivamos, pois, do Ressuscitado e como ressuscitados. Sejamos sinais/portadores de ressurreição no mundo. Anunciemos com nossa própria vida a Páscoa do Senhor. Que ela se concretize e se manifeste na páscoa nossa de cada dia…