“O Vaticano II faz-nos passar de uma Igreja-cristandade para uma Igreja-missão, uma Igreja toda ela missionária” (Dom Aloísio Lorscheider).
A Igreja – como qualquer outra realidade – é no mundo, é mundo e – ser no mundo, ser mundo – significa ser na totalidade das coisas existentes, ser parte integrante dessa totalidade. Como Instituição humana, porém, a Igreja não só é no mundo, é mundo, mas sabe – tem consciência – de ser no mundo, de ser mundo. Por isso, a Igreja é com o mundo, se relaciona com o mundo.
A relação da Igreja com o mundo acontece de quatro maneiras.
Na 1ª, a Igreja é fermento no mundo. É a Igreja sal da terra e luz do mundo. É a Igreja encarnada na vida do povo. É a Igreja na Base e de Base, que anuncia – com o testemunho e com a palavra – a Boa Notícia de Jesus de Nazaré: o Reino de Deus. É a Igreja Comunhão: Comunidade de irmãos e irmãs em Cristo, filhos e filhas do mesmo Pai-Mãe (Deus), iguais em dignidade e valor, que – na diversidade de ministérios (serviços) e carismas (dons) – transforma o mundo por dentro.
Na 2ª, a Igreja absorve o mundo. É a Igreja poder espiritual e temporal. É a Igreja que – com seu poder religioso imperial – quer dominar o mundo em nome de Deus. É a Igreja-cristandade, triunfalista, cheia de luxo e de pompa. Basta lembrar a tiara que era usada pelo Papa.
Na 3ª, a Igreja se opõe ao mundo. É a Igreja que combate o mundo. O mundo é mau, não presta e está perdido. É a Igreja que – por se opor a tudo o que é do mundo – prega a fuga do mundo e a salvação das almas.
Na 4ª, a Igreja é paralela ao mundo. É a Igreja que – mesmo sem se opor – não se interessa pelo mundo. Afirma que tudo o que é do mundo não tem nada a ver com a Igreja. É a Igreja voltada para dentro de si mesma: fundamentalista, individualista e intimista. Sua história é paralela à história do mundo.
Essas quatro maneiras de a Igreja se relacionar com o mundo não são cronológicas. De alguma forma – por ser a Igreja (Instituição e pessoas) santa e pecadora – estão sempre presentes, mas uma delas predomina. A primeira – o jeito de ser Igreja que Jesus quis e quer – predominou na Idade Antiga; a segunda, na Idade Média; a terceira, na Idade Moderna; e a quarta, na Idade Contemporânea (em parte).
Nos últimos 55 anos – depois do Concílio Vaticano II – a primeira maneira de a Igreja se relacionar com o mundo – a de Jesus de Nazaré – irrompeu novamente com toda força do Espírito Santo.
O Concílio Vaticano II fez e ainda faz nos passar de uma Igreja que absorve o mundo – “Igreja-cristandade” – e também, de uma Igreja que se opõe ao mundo ou que não se interessa pelo mundo (2ª, 3ª e 4ª maneiras) para uma Igreja que é fermento no mundo – “Igreja-missão, Igreja toda ela missionária” – (1ª maneira).
Há algum tempo, porém, num processo de retorno ao modelo de Igreja pré-conciliar – articulado pelas forças conservadoras e reacionárias da Igreja (refiro-me à Igreja Católica) – há um embate entre a primeira e a quarta maneira de a Igreja se relacionar com o mundo. Com certeza, a primeira será vitoriosa, porque Jesus quer.
“Como Cristo, por sua encarnação ligou-se às condições sociais e culturais dos seres humanos com quem conviveu; assim também deve a Igreja inserir-se nas sociedades, para que a todas possa oferecer o mistério da salvação e a vida trazida por Deus” (A atividade missionária da Igreja – AG, 10).
É urgente! Ouçamos as palavras do nosso irmão o Papa Francisco e seu premente apelo: “Soube que são muitos na Igreja aqueles/as que se sentem mais próximos dos Movimentos Populares. Muito me alegro por isso! Ver a Igreja com as portas abertas a todos vocês, que se envolve, acompanha e consegue sistematizar em cada Diocese, em cada Comissão ‘Justiça e Paz’, uma colaboração real, permanente e comprometida com os Movimentos Populares. Convido-vos a todos, bispos, sacerdotes e leigos (todos os cristãos/as), juntamente com as organizações sociais das periferias urbanas e rurais, a aprofundar este encontro” (2º Encontro Mundial dos Movimentos Populares. Santa Cruz de la Sierra – Bolívia, 09/07/15). É esse o caminho para sermos – hoje – Igreja-missão (Igreja “em saída”)!
Com este texto, termino a primeira série de artigos sobre a Igreja que o Vaticano II sonhou.