No dia 11/11/2022, o mestre e amigo Pedro Ribeiro publicou um artigo falando do “racha” na Igreja Católica. Em conversa no encontro que participamos juntos, falamos sobre isso. Artigo que merece toda atenção da instituição católica (Veja o artigo aqui).
Quando terminou o segundo turno, a ideia desta coluna apareceu, antes do artigo de Pedro. Mas aqui se trata de uma pequena narrativa na qual um modesto teólogo tenta apenas levantar o tapete e ver a poeira que está embaixo. Trata-se da afirmação de que o conceito de comunhão, tão rico para Igreja, está sendo afirmado como um “verniz superficial”, expressão de São Paulo VI no número 20 da Evangelii Nuntiandi. Ora, até quando a hierarquia católica vai se esconder debaixo de um conceito de comunhão um tanto quanto distorcido?
Fala-se de uma “polarização” construída artificialmente em vista de um jogo de poder que esconde muita coisa. Em nome da sã doutrina se legitima uma série de ações que não se coadunam com o Caminho de Jesus Cristo.
Não se trata de defender um lado de forma maniqueísta, mas à luz do Evangelho e da Tradição da Igreja, verificar os absurdos que tem deixado marcas profundas na realidade brasileira. E aí, inegavelmente, um setor integrista, por que não dizer, fascista, forjou discursos de ódio onde nem o Papa escapa.
Quando os progressistas estiveram à frente do governo federal não havia perfeição. Contudo, havia um ambiente onde predominava o respeito ao estado democrático de direito. Mas quando um determinado presidente que diz “jogar sempre nas quatro linhas da constituição” chegou, os diversos mecanismos de perversão da estrutura simbólica, baseado nitidamente na mentira, tornou-se um recurso fundamental para incutir medo, chegando a produzir ações violentas, como nunca antes se viu desde a redemocratização do país.
E uma das vítimas deste processo é a Igreja Católica. Vítima porque em seu interior, apesar de existirem pessoas de caráter duvidoso, existem muitas pessoas boas. E aí, assistimos diversas agressões. Agressões feitas em nome de uma heresia: “Deus acima de todos e Brasil acima de tudo”. O Brasil se tornou maior do que Deus, pois tudo é mais do que todos.
Padres, ministros e ministras, sendo achincalhados durante missas. Até ameaças da integridade física, como aconteceu com Dom Vicente, bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte. Discriminação e intolerância a quem fazia outra opção. Um padre disse que não daria a eucaristia a quem votasse no “vermelho”, outro pediu para os “vermelhos” se retirarem da igreja. Desde a juventude que acompanho política, posso dizer que vi muitos erros da chamada “esquerda”, mas nunca vi tamanho desrespeito. Na região que moro, se tinha medo de colocar adesivos no corpo ou plásticos nos carros. Setores consideráveis das polícias inviabilizando a liberdade de votar. Apoiados, inclusive, por milicianos.
Vamos colocar tudo isso debaixo de um conceito de comunhão que não reconhece a unidade na pluralidade? Que não é capaz de dialogar com as diferenças, na perspectiva poliédrica apontada pelo Papa Francisco? Que parece abafar conflitos e tensões que precisam ser tratados e não escondidos? Vamos permitir que a Igreja sangre cada vez mais, em nome de uma comunhão que enfraquece a força renovadora do Caminho de Jesus Cristo no meio do mundo?
É lamentável se verificar que, para muitos, a diminuição dos fiéis católicos não seja um problema se uma “elite” econômica a mantiver. Elite entre aspas, pois a maioria são pessoas que simplesmente não querem perder privilégios. Os setores integralistas perceberam que não é vantagem ficar fora da grande instituição, então forçam os progressistas a saírem sem cisma.
Não é possível que o episcopado brasileiro se mantenha calado diante de grupos, como o Instituto Dom Bosco, que mente, mente descaradamente, sob o brasão da Igreja Católica. Sabe-se que pouco se pode fazer canonicamente. Talvez se possa fazer algo civilmente. Mas um posicionamento afirmando que este grupo não é a voz oficial da Igreja Católica é perfeitamente possível.
A unidade é uma qualidade necessária justamente por respeitar a diferença. A unidade não é uma uniformização. A unidade não procura desqualificar, mas assumir o que existe de bom em todos e todas. Em tempos de Sínodo, precisamos reaprender a caminhar juntos. Unamo-nos.
Como disse Martin Luther King: “Ou aprendemos a viver como irmãos, ou vamos morrer juntos como idiotas”.