ColunistasPadre Francisco Aquino Júnior

Genivaldo: mais uma vítima da Milícia Estatal

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Genivaldo de Jesus dos Santos, um negro de 38 anos com transtorno mental, foi cruelmente assassinado pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) no município de Umbaúba em Sergipe, no dia 25 de maio. Depois de ter sofrido xingamentos, rasteira e chutes e de ser imobilizado por dois agentes que colocaram os joelhos sobre seu tórax, foi jogado no porta-malas da viatura com as pernas para fora. Achando pouco, um dos agentes jogou uma bomba de gás lacrimogêneo no porta mala. Genivaldo foi asfixiado/assassinado numa “câmara de gás” – técnica nazista usada nos campos de concentração. A brutalidade dos policiais não parava, mesmo sendo informados que a vítima tinha transtornos mentais e encontrando em seu bolso apenas medicamento controlado. E qual o crime de Genivaldo de Jesus? Dirigir sem capacete – o mesmo crime que o Presidente da República e seus seguidores cometem constantemente em suas motociatas pelo Brasil afora, amplamente divulgadas pela mídia e com proteção de enorme aparato policial.

Em nota, a PRF de Sergipe diz que Genivaldo “resistiu ativamente a uma abordagem” e, por isso, “foram empregados técnicas de imobilização e instrumentos de menor potencial ofensivo para sua contenção”. E afirma que, “durante o deslocamento, o abordado veio a passar mal e foi socorrido de imediato ao hospital, onde posteriormente foi atendido e constatado o óbito”. Desde quando tortura e “câmara de gás” são “técnicas de imobilização e instrumentos de menor potencial agressivo”???? São técnicas nazistas empregadas por grupos milicianos, dentro e fora das corporações policiais. São práticas criminosas que atentam contra a dignidade humana e contra o Estado de Direito.

A tortura é uma prática bastante comum em operações policiais nos presídios, nas periferias e com setores populares, especialmente com a população negra. E uma prática cada vez mais respaldada por amplos setores da população e até difundida e promovida por chefes de governo. O assassinato de Genivado não é um fato isolado. As forças policiais brasileiras estão entre as mais letais da América Latina. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública revelam que em 2020 foram assassinadas por policiais civis e militares 6.416 pessoas – um crescimento de 190% em relação a 2013. O Estado de Sergipe tem o 3º maior índice de mortes por policiais, perdendo apenas para Amapá e Goiás. O Rio de Janeiro é líder em números absolutos: 20% do total de mortes por policiais – em sua imensa maioria jovens (76,2%), do sexo masculino (98,4%) e negros (78,9%). Segundo o Instituto Fogo Cruzado, das 44 chacinas em 2020 na região metropolitana do Rio de Janeiro, 33 aconteceram em ações e operações policiais com 134 mortos. Em 2021, das 66 chacinas, em 46 delas houve operação policial com 195 mortos.  A mais recente aconteceu dia 24 de maio de 2022 na Vila Cruzeiro com 23 mortos.

Nada justifica essa prática criminosa cada vez mais comum em operações policiais em áreas e setores marginalizados. Isso é um atentado contra a dignidade humana e contra o Estado de Direito. E para quem crê no Deus que criou o ser humano à sua imagem e semelhança, isso é um pecado mortal que clama ao céu: atenta contra Deus quem atenta contra sua obra criadora! O combate ao crime (que não existe só nas favelas e periferias!) não pode ser feito de forma criminosa. As forças policiais não podem agir como milícias de Estado à margem e acima da lei. Nem podem ser protegidas e promovidas por chefes e órgãos de Estado simpáticos ou aliados a organizações/práticas milicianas. É preciso dar um basta a essa prática miliciana nas operações policiais.

Genivaldo de Jesus é mais uma vítima de agentes milicianos nas corporações policiais. Seu assassinato revela o grau de desumanidade e monstruosidade de seus algozes, bem como a prática criminosa de agentes milicianos nos aparatos policiais. E nos convoca e nos compromete no combate a toda forma de tortura e na defesa incondicional da dignidade humana. Nem por humanidade nem muito menos por fé religiosa podemos ficar indiferentes a isso. Em Genivaldo, nossa humanidade foi ferida mortalmente. Em Genivaldo, Cristo continua sendo crucificado. Ele é a carne crucificada de Jesus Cristo numa sociedade e num governo que se dizem cristãos, mas renegam seu Evangelho e o assassinam numa cruz ou numa câmara de gás…

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