Vimos que o Ser humano é um “ser-no-mundo” (“ser-na-Terra”, “ser-no-Universo”) – “ser-no-espaço”, “ser-no-tempo” – e que a “mundanidade” – “espacialidade” e “temporalidade” – é a condição existencial do Ser humano e de todos os seres.
Ora, o Ser humano – por “ser-no-mundo” conscientemente (ou seja, por saber – enquanto ser racional – de “ser-no-mundo”) – percebe-se a si mesmo como um “ser-com-o-mundo”: com-o-mundo material e vivente e com-os-outros (semelhantes), e com-o-Outro absoluto (Deus).
O Ser humano é, portanto, um “ser-no-mundo-com-o-mundo” e, ao mesmo tempo, um “ser-com-o-mundo-no-mundo”. O “ser-no-mundo-com-o-mundo” coloca a ênfase no “ser-no-mundo” conscientemente. O “ser-com-o-mundo-no-mundo” coloca a ênfase na “consciência” de “ser-no-mundo”.
Em outras palavras, o Ser humano – por “ser-no-mundo” conscientemente – percebe-se a si mesmo como um ser “pluri-dimensional” e “pluri-relacional” (ser de dimensões e de relações). “Onde existe uma relação, ela existe para mim: o animal não se ‘relaciona’ com nada, simplesmente não se relaciona. Para o animal, sua relação com os outros não existe como relação” (Marx, K. e Engels, F. A Ideologia Alemã (I- Feuerbach. Hucitec, São Paulo, 10865, p. 43). “Minha relação com meu ambiente é a minha consciência” (Ib., nota**).
Ora, como o Ser humano é um ser de relações interligadas, interconectadas e interdependentes, podemos falar dele partindo da relação com-o-mundo material e vivente e com-os-outros (semelhantes), e com-o-Outro absoluto (Deus) no-mundo; ou – vice-versa – no mundo, partindo da relação do Ser humano com-o-Outro absoluto (Deus), com-os-outros (semelhantes) e com-o-mundo material e vivente.
No caso, o Ser humano é com-o-Outro absoluto (Deus), com-os-outros (semelhantes) e com-o-mundo material e vivente, no-mundo e – ao mesmo tempo – é no-mundo, com-o-Outro absoluto (Deus), com-os-outros (semelhantes) e com-o-mundo material e vivente.
No Ser humano, as relações e as dimensões se confundem, se misturam e o destaque pode ser dado a qualquer uma delas na interligação e interconexão com as outras.
Enquanto “ser-com-o-mundo”, o Ser humano percebe-se também como um “ser-com-o-espaço” e um “ser-com-o-tempo”.
Por “ser-com-o-espaço” entende-se o espaço físico (geográfico), o espaço biológico e, sobretudo, o espaço humano: espaço histórico-social (sócio-econômico-político-ecológico-cultural-religioso) e espaço histórico-individual (corpóreo, bio-psíquico e espiritual ou pessoal).
Portanto, “ser-com-o-espaço”, significa para o Ser humano ser com todos estes espaços, mas principalmente com o espaço humano, que incorpora ou integra os outros espaços.
Por “ser-com-o-tempo” entende-se o tempo que se articula em três momentos: passado, presente e futuro. A “temporalidade” não se identifica com nenhum destes momentos isoladamente, mas com a unidade ou mútua interferência de todos com todos. Assim, os três momentos do tempo formam conjuntamente um todo contínuo (Cf. Peña, J. L. Ruiz de la. As novas Antropologias. Um desafio à Teologia. Loyola, São Paulo, 1988, p. 18).
Antes de tudo, o Ser humano “é-com-o-tempo” matemático – objetivo, cronológico, cosmológico. A existência do Ser humano pode ser datada cronologicamente entre o nascimento e a morte. Esse tempo, porém, não é específico do Ser humano. “O ser temporal é um estatuto objetivo da existência humana, independentemente da sua intenção pela consciência” (Vaz, H. C. de Lima. Ontologia e História. Duas Cidades, 1968, p. 267).
Em segundo lugar, o Ser humano – também e sobretudo – “é-com-o-tempo” humano, que é diferente do matemático. No tempo matemático, “o presente tende a desaparecer (a desfazer-se): ele não é um momento que pode ser preso entre um futuro que ainda não é (existe) e um passado que já não é mais. No tempo humano, ao contrário, o presente é o aspecto determinante. Trata-se de um presente que fundamentalmente se estende também ao passado e ao futuro. O passado aparece e é vivido como passado, porque continua, de certa maneira, presente ao Ser humano, ou, mais exatamente, porque o Ser humano continua, de certa maneira, presente ao tempo passado. O futuro aparece como futuro, porque é antecipado no presente como apelo, projeto, possibilidade” (Gevaert, J. Il problema dell’uomo. Introduzione all’Antropologia Filosofica. Elle Di Ci, Torino, 19814, p. 188. Cf. Heidegger, M. Ser e Tempo – Parte II. Vozes, Petrópolis, 1989, § 68, p. 132-149).
No próximo artigo – continuando o mesmo tema – refletiremos sobre o Ser humano como “ser-com-o-mundo material e vivente” e “ser-com-os-outros” (semelhantes).