Dentro do Seminário “Cláudio Perani – Legado Profético: Desafios e Perspectivas”, a sede o ITEPES – Instituto de Teologia, Pastoral e Ensino Superior da Amazônia, de Manaus tem acolhido uma mesa redonda onde foram debatidos novos caminhos para uma Igreja com rosto amazônico.
A mediação de Patrícia Cabral, Presidenta do Conselho do Laicato da Arquidiocese de Manaus foi introduzindo as falas dos ponentes. O diretor do Instituto, Padre Ricardo Castro, mostrou os elementos inspiradores no pensamento do Padre Cláudio Perani para o Sínodo da Amazônia. Nesse sentido, ele lembrava que no pensamento de Perani, além das diferentes compreensões sobre a Amazônia, precisamos conhecer seus povos, nos aproximarmos das pessoas para aprender das suas experiências, uma atitude que está muito presente no pensamento e discurso do Papa Francisco em referência ao Sínodo da Amazônia. Ele quer que o Sínodo brote da vida do povo, da escuta.
O jesuíta falecido há dez anos, falava de uma nova ética missionária, que leve a ver o mundo a partir do outro, do pobre, a viver de igual para igual, a viver a solidariedade desde o diálogo. Ele, ao se referir à Igreja da Amazônia, usava o termo “Igreja de palha”, das tendas do deserto, com poucos recursos, provisória, porque está sempre a caminho. Desde aí, Ricardo Castro vê o Sínodo como “novos caminhos, que na perspectiva de Cláudio Perani já estão sendo ensaiados, que têm que nos levarmos a resgatar experiências já presentes no povo e na Igreja da Amazônia”.
Isso deve ter como conseqüência “uma Igreja com rosto leigo e ministerial, que visa uma Igreja descolonizada, numa aproximação dialógica e ecológica com as culturas locais”, com um papel decisivo das mulheres nas comunidades. Por isso, o Diretor do ITEPES se perguntava se a falta de padres e a grande presença de leigos não é um sinal de que a Igreja deve mudar. Fazem-se necessários novos caminhos dialógicos e interconectados, não paralelos. Aprender com Cláudio Perani, definido por Ricardo Castro como um missionário etnógrafo, sempre com o caderno para anotar e transformá-lo em metodologias de trabalho, valorizando assim a sabedoria popular.
“No Brasil está acontecendo uma guerra fria entre o governo e os defensores dos direitos”, afirma Francinara Martins, Coordenadora Geral da COIAB – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira. A conseqüência disso é “o sofrimento dos povos, sobretudo mulheres, crianças e os mais velhos”. A coordenadora da COIAB se perguntava o que fazer para ter garantias diante dos grandes projetos, dentro das perspectivas da convivência e o Bem Viver frente aos mega-projetos de exploração, cada vez mais presentes na Amazônia.
“Basta, chega de tanto retrocesso, de não nos ouvirem, de não nos enxergar, de dizer que os povos indígenas não sabem”, afirmava Francinara, quem diz que os povos indígenas “não temos medo de defender nossa família, nosso território”, pois como ela afirma, “nossa grande luta é a luta pela Mãe Terra”. A coordenadora da COIAB denunciava que, mesmo sendo hoje parceira nas lutas, teve um tempo em que a Igreja viu a cultura indígena como algo que não é de Deus, mas a situação está se repetindo com algumas Igrejas evangélicas.
Francinara insistia na importância da mulher na Amazônia, pois “elas não destroem, são geradoras da vida” e junto com isso que elas não estão para competir com os homens e sim para todos estar lado a lado. Ao mesmo tempo denunciava a falta de políticas públicas para os povos indígenas no Brasil, país que se pergunta se tem salvação. Também insistia em que diante dos perigos está surgindo uma atitude de auto vigilância.
Escutar os povos da Amazônia é uma necessidade para o mundo, segundo o salesiano indígena Justino Sarmento Rezende, assessor do Sínodo da Amazônia. Ele insiste em “mostrar ao mundo que o projeto de Deus já está semeado no coração das pessoas da Amazônia”. Falando sobre os desafios e perspectivas de uma Igreja com rosto amazônico, Justino vê o Sínodo como momento para se perguntar “como organizarmos para cuidar da vida, viver em convivência, estar com o diferente, partilhar a vida, se alegrar, chorar, se pintar, ritualizar”. Faz-se necessário que os missionários se insiram na realidade amazônica e assumam suas culturas para acabar com o colonialismo”.
Hoje os indígenas, segundo o Padre Justino, “somos interculturais, com espiritualidades diversificadas e transversais”. Ele lembra que quando chegaram os europeus, os povos indígenas já estavam aqui. Nesse sentido, lembrava uma afirmação que já fez na frente do Papa Francisco, “quem pode achar novos caminhos para a Igreja da Amazônia é quem mora nela”. Frente a isso, ele afirma que o rosto da Igreja da Amazônia ainda é branco. Para mudar isso, “a Igreja tem que conceder os ministérios aos povos da Amazônia, sem medos nem desconfianças”. Para o assessor do Sínodo, o rosto amazônico da Igreja deve ser simples, direto e de esperança, afirmando que “nós temos nossas sabedorias indígenas”.
Uma realidade presente na Amazônia são as comunidades indígenas urbanas. Marcivana Rodrigues Paiva, representante da COPIME – Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno, afirma que nessa cidade existem 45 povos e 15 línguas diferentes. Nesse sentido, “o indígena não deixa de ser indígena por estar na cidade”, segundo Marcivana, para quem o que falta é reconhecimento, o que implica falta de direitos. Ela mostra alguns perigos dos índios nas cidades, como é o fato de perder a cultura, pois a cidade acaba impondo seus valores e traz novos modos de vida. Desde essa perspectiva, a indígena afirma que “para ter um rosto amazônico, a Igreja deve respeitar e assumir a cultura indígena, suas simbologias”.