A vacinação em crianças é histórica no Brasil, sendo inclusive a salvação de muitas crianças em epidemias infantis. Embora as narrativas sobre a vacinação no Brasil, para a população em geral, mostrem que houve momentos conturbados, como em 1904, durante um surto de varíola, quando o Congresso aprovou a sugestão do médico sanitarista Oswaldo Cruz, sobre a obrigatoriedade da vacina para toda a população. Isso causou muito incômodo no povo oprimido, já cansado de cumprir tantas “obrigações”. Na época surgiu até um movimento chamado a Revolta da Vacina. Contudo, em 1908, quando houve novo surto da doença, a população, fez um movimento contrário, procurou a vacinação, sem que a mesma precisasse ser indicada por lei.
Nos últimos tempos, mesmo com o esforço e avanço da ciência em fazer a campanha vacinal chegar em todos os lugares, deparamo-nos com doenças que pensávamos erradicadas voltarem novamente ao cenário brasileiro e, em muitas regiões, a procura por vacinas infantis, ser cada vez mais desafiadora.
Segundo a nossa Constituição Federal de 1988, no artigo 196, “… a saúde é um direito de todos e dever do Estado, que deve ser garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Cita ainda a Constituição que ela é de relevância pública, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle.
Estranho é – em meio a uma pandemia que já tirou a vida de mais de seiscentas mil pessoas no Brasil -, além de considerar que um Plano de Vacinação deveria contemplar as crianças, ao chegar a vez das crianças se vacinarem, cheguem estes questionamentos, vindos de um órgão que deveria ser o primeiro incentivador da vacinação. Obviamente, que a preocupação é mais uma vez, usar os inocentes como “moedas de troca” e neste caso, de trocas de favores políticos, mirados nas eleições de 2022. Mais uma vez, o negacionismo, o desconhecimento científico, o ódio, a vaidade tomam conta.
É inegável que esta pandemia tenha exposto novamente o dramático tema da infância brasileira, sempre relegada, abandonada, mesmo tendo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), criado para a sua defesa, através do artigo 227 da Constituição Federal. Mas quem garantia esta defesa? Eram os Conselhos de Direitos desde o âmbito nacional até os municípios, criados em 1991, mas foram estraçalhados pelo Presidente da República em 2019, através de decreto que cassou o mandato de todos os conselheiros, diminuiu a composição da sociedade civil e alterou significativamente sua função. Chegou a dizer durante uma campanha no interior de São Paulo que: “o ECA tem que ser rasgado e jogado na latrina. É um estímulo à vagabundagem e à malandragem infantil”.
Isso me reportou à história das crianças na Bíblia, onde as mesmas eram sacrificadas e mortas para “apaziguar a ira dos deuses”, em épocas de crises ou guerras (2Rs.16.3; 21.6; 23.10; Jr.7.31, 19.5; 32.35; Ez.16.21). Ou ainda, havia o costume de sacrificar uma criança quando fosse construída uma casa, um templo, uma cidade, enterrando-a debaixo das fundações para atrair a proteção dos deuses, os chamados “sacrifícios de fundação”:
“Era assim que a religião de Canaã procurava a proteção dos deuses para a casa, o palácio, o templo e a cidade. Por isso, a cidade de Jericó foi reconstruída ‘pelo preço’ de duas crianças” (1Rs.16.34) (MESTERS 1997, Criança, Prioridade Absoluta no Reino de Deus).
Eram tantos os sacrifícios humanos de inocentes que Ezequiel chega a dizer no Oráculo sobre os Montes em Israel: “Tu privas de filhos a tua nação” (Ez 36,13). Assim também estão sendo privadas nossas crianças de uma vida digna e saudável, tudo para agradar os aliados e acalmar os ânimos daqueles aos quais devem favores.
Mas o que as CEBs têm a ver com isso? Tudo! Inclusive o compromisso de reassumir os papéis de Sefra, Fua, Jocabed e Míriam (Ex1,15; 2,1.6) que, na Bíblia enfrentaram e desobedeceram as ordens do Faraó, para reiniciar a luta em defesa da vida ameaçada das crianças. No caso hoje, especificamente, ameaçadas pelo governo federal, nas pessoas do Presidente da República Jair Bolsonaro e do Ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.
Muitos de nós trazemos a marca registrada das vacinas no braço. Vamos garantir que nossas crianças vacinadas recebam, no cartão de vacinação, um documento de vitalidade.