2020 foi um ano muito difícil no mundo inteiro e de modo particular no Brasil. Um conjunto de pragas/pandemias se abateu sobre nós, causando uma grande tragédia.
A pandemia do coronavírus contaminou milhões de pessoas (quase 7 milhões de casos confirmados no país), matou mais de 190 mil brasileiros, impedindo até mesmo um velório e um sepultamento digno, destruiu milhares de postos de trabalho, comprometeu a educação dos estudantes, sobretudo dos mais pobres e aumentou os índices de depressão, de conflito familiar e de violência contra mulheres e idosos.
A pandemia do desgoverno brasileiro agravou ainda mais a situação, com banalização da pandemia (uma “gripezinha”) e da ciência (tudo se resolve com cloroquina), com a ausência de uma política nacional de combate à pandemia (vários meses sem ministro da saúde), com o estímulo à população a desrespeitar as medidas de isolamento social, com o boicote a medidas de proteção aos povos indígenas e à população carcerária e com os conchavos políticos para desregulamentação das leis de proteção ambiental (“ir passando a boiada”), privatização do SUS e da saúde mental, desvio legal do Fundo Nacional de Educação para as escolas privadas, dentre outros.
A pandemia da injustiça social, que é a maior e a pior de todas, tornou essas outras pandemias ainda mais trágicas e foi profundamente agravada por elas. Se o desmonte das políticas sociais em curso, sobretudo a partir do golpe de 2016, vinha aumentando enormemente a pobreza e a miséria no país (2016 a 2017: mais 2 milhões de pessoas vivendo com até 406 reais por mês e mais quase 2 milhões vivendo com até 140 reais por mês), essa situação se agravou enormemente com as pandemias do coronavírus e do desgoverno brasileiro. O Brasil volta a conviver com a tragédia da fome. E quando acabar o auxílio emergencial a situação vai se tornar ainda mais dramática.
No meio de tantas pandemias, o anseio e a busca de paz, sempre presentes na vida humana e fortemente destacadas nas festas de natal e ano novo, concretizam-se como esperança e busca de superação dessas pandemias. O papa Francisco nos recorda que a resposta à pandemia é dupla: “é essencial encontrar uma cura para um pequeno mas terrível vírus que põe o mundo inteiro de joelhos” (vacina contra o COVID-19), mas também “devemos curar um grande vírus, o da injustiça social, da desigualdade de oportunidades, da marginalização e da falta de proteção aos mais débeis” (vacina contra as injustiças sociais). E, no nosso caso, temos ainda que superar o vírus do desmonte das políticas sociais e da aversão aos direitos humanos (vacina contra o bolsonarismo).
Já temos vacinas contra o COVID-19, embora não saibamos ainda quando toda população estará vacinada e qual sua real eficácia. Quanto às vacinas contra as injustiças sociais e contra o bolsonarismo, estão sendo desenvolvidas e testadas nos laboratórios da vida. Em todo caso, embora não tenhamos uma fórmula, sabemos quais os insumos necessários para sua produção: respeito à dignidade humana, cuidado e proteção do meio ambiente, função social da propriedade, políticas públicas de afirmação de direitos dos setores pobres e marginalizados da sociedade: trabalhadores, desempregados, camponeses, indígenas, negros, mulheres, população LGBT, encarcerados, catadores de material reciclável, população em situação de rua etc. Nas palavras do papa Francisco: cuidado da casa comum, fraternidade universal, direitos dos pobres e marginalizados.
Se queremos mesmo superar essas pandemias, temos que construir vacinas eficazes para a paz. Seus insumos fundamentais são “o direito e a justiça” (Is 1,27), já que “a paz é fruto da justiça” (Is 32,17). E sua produção se dá, na força do Espírito, nas relações interpessoais e sociais e nas lutas pelos direitos dos pobres e marginalizados.