No dia 28 de fevereiro de 2017, a Fazenda Anonni – primeira ocupação brasileira de famílias organizadas dentro do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra recebeu milhares de romeiros e romeiras na 40ª Romaria da Terra do Rio Grande do Sul, na Paróquia Santo Antão em Pontão na Área Pastoral de Sarandi, na Arquidiocese de Passo Fundo. A edição comemorativa do evento, que acontece sempre na terça-feira de Carnaval por ocasião do aniversário de morte de Sepé Tiaraju, foi norteada pelo tema “Romaria da Terra: 40 anos de luta e memória das conquistas” e pelo lema “Terra de Deus, terra de irmãos”.
O evento foi organizado desde maio de 2016 por representantes da Comissão Pastoral da Terra do Rio Grande do Sul (CPT-RS), da CNBB Regional Sul III, da Arquidiocese de Passo Fundo e do MST que, em reuniões ampliadas, debatem sobre a atual situação agrária do país.
Símbolo de resistência do MST e da luta pela terra, a ocupação da Fazenda Annoni ocorreu em 29 de outubro de 1985 por mais de 7 mil trabalhadores rurais sem-terra, e foi à primeira realizada por famílias organizadas no MST, que já vinham se estruturando desde o acampamento Encruzilhada Natalino, também na região Norte do estado.
Oito anos depois, em 1993, a área de 9.300 hectares foi destinada para fins de reforma agrária. A partir disto, o MST se consolidou como movimento popular e suas práticas se disseminaram por todo o território nacional.
Acampamento da Juventude
Um símbolo forte da Romaria da Terra é a juventude de todo do estado e de várias regiões do país participaram do Acampamento da Juventude que, desde 2005, faz parte da Romaria e busca debater, refletir e celebrar o tema proposto pelo evento a partir de suas vivências e anseios. O Acampamento, espaço sócio-político-formador que surgiu por iniciativa da própria juventude, neste ano aconteceu nos dias 26 e 27, na área 01 da Fazenda e vai refletir o tema “Juventude construindo projeto popular” e o lema “Prefiro morrer na luta do que morrer de fome” – em memória à Roseli Nunes, militante da luta pela terra morta em um protesto, em 1987 -. Os jovens foram envolvidos em diferentes plenárias, falas e exposições, além de oficinas práticas.
A programação inda contou com uma noite cultural e da Celebração dos Mártires, ponto alto dos momentos de espiritualidade, no qual fazem memória aos irmãos e irmãs que tombaram lutando por justiça, direitos, igualdade, terra, pão, vida em abundância.
A seguir disponibilizamos a Oração e a Carta Final da 40ª Romaria da Terra
ORAÇÃO DA 40ª ROMARIA DA TERRA
Deus Pai, / criador de todos os bens da natureza, / da Mãe Terra;
cremos que a terra é lugar e fonte de vida; / cremos na terra da libertação, / da fartura e da abundância, / da partilha, da igualdade e da justiça. / Estamos vivendo a 40ª Romaria da Terra. / Com alegria, te rendemos graças / porque criastes a terra, como mãe, / lugar de morar e viver, / plantar, colher, amar…
Ó Pai, queremos elevar até vós / o clamor de tantos Sem Terra, / indígenas e quilombolas, / jovens e mulheres, / agricultores e ecologistas… / que gritam por dignidade, / justiça e direitos.
Ó Deus da vida, / nestes quarenta anos de Romarias da Terra, / no Rio Grande do Sul, / tivemos muitas conquistas / em favor da vida e dos direitos do Povo. / Queremos Te agradecer / por tantos irmãos e irmãs / que resistiram na luta pela terra e na terra, / fazendo da terra lugar de trabalho e resistência.
Ó Deus da vida e Senhor da história, / o sonho de Teu Povo / é que a terra seja partilhada / e repartida entre todos. / Estamos renovando, hoje, / nosso propósito de continuar lutando / por uma “terra sem males” / e por um mundo mais justo e fraterno.
Senhor, que a 40ª Romaria da Terra / nos conscientize a cuidar da terra e da água, / como bens preciosos; que os Santos Mártires da Terra, / especialmente Sepé Tiaraju e Rose, / intercedam por nós / e nos ajudem a alimentar nossa utopia / e nossa sonho da Reforma Agrária.
Ó Deus da vida e Senhor do universo, / continuamos acreditando e lutando / pela “Terra de Deus como terra de irmãos”!
Amém! Axé! Awere! Aleluia!
Carta Final da 40º Romaria da Terra do Rio Grande do Sul
Carta às Comunidades
Nós, romeiros e romeiras da 40ª Romaria da Terra, realizada no Assentamento Fazenda Anonni, município de Pontão, queremos saudar a você e sua Comunidade. E, ao mesmo tempo, partilhar o que vivemos, vivenciamos e assumimos nesta Romaria.
São 40 anos que caminhamos em Romaria da Terra, no Rio Grande do Sul. Já avistamos muitos horizontes, contemplamos muitas matas e paisagens, percorremos muitos quilômetros, denunciamos muitas injustiças, comemoramos e celebramos muitas conquistas, fizemos memória de muitos mártires e companheiros de luta, especialmente, entre nós, a Rose e o índio Sepé Tiaraju.
Comemorando os 40 anos de Romarias da Terra no RS, somos como o Povo de Deus que vagueia pelo deserto em busca da Terra Prometida. Ao celebrar essa bela caminhada das Romarias da Terra, tivemos como lema: Terra de Deus, Terra de Irmãos! É isso mesmo! Cremos que Deus continua presente com aqueles que lutam pela terra dos irmãos e a vida abundante para todos. E com São Sepé Tiaraju reafirmamos: Alto lá! Esta terra tem dono!
Desde o Assentamento da Fazenda Anonni, revivemos o momento de sua ocupação, em 1985, o tempo de acampamento, a 9ª Romaria da Terra, de 1986, o assentamento das 423 famílias, com toda a sua produção. Contemplamos as maravilhas que aconteceram neste tempo de vida e de organização do MST, na região e no Estado. Sentimos de perto os frutos da Reforma Agrária, especialmente através da Feira dos produtos dos Assentamentos do RS.
Como fizemos desde a 1ª Romaria da Terra, continuamos a denunciar todo o sistema econômico, social e político vigente em nosso País, o agronegócio, intrinsecamente perverso, da lógica de acumulação, da ganância, que gera divisões sociais, exploração, opressões, sofrimento e morte.
A partir desta 40ª Romaria da Terra, reafirmamos nossos compromissos:
Apoio e compromisso com a Reforma Agrária popular;
Incentivo a toda forma de agricultura familiar e camponesa, associativa e cooperativa;
Busca de uma organização social e sindical para garantir os direitos negados;
>> Estímulo a toda forma de produção de alimentos saudáveis e agroecológicos;
Produção de sementes crioulas para não sermos dependentes de empresas multinacionais;
Combate à desmoralização, a criminalização e a repressão dos Movimentos Sociais;
Engajamento na luta das mulheres e dos jovens contra todo tipo de violência;
Compromisso com o protagonismo dos jovens nas esferas eclesiais e sociais;
Defensa da biodiversidade e dos biomas brasileiros, em especial nosso Pampa;
Fortalecimento do trabalho de base e da aproximação dos explorados e excluídos;
Luta por uma educação no campo e na cidade que valorize a inclusão social e econômica;
Participação da juventude e dos trabalhadores nos espaços de construção de políticas públicas;
>> Demarcação das terras indígenas e quilombolas e respeito às suas culturas;
Resgate dos saberes populares, como a medicina e a alimentação alternativas;
Trabalho de conscientização dos direitos humanos e sociais;
Preparação de militantes das causas sociais e comunitárias;
Formação de Comunidades Eclesiais de Base e organização das Pastorais Sociais;
Trabalho ecumênico a partir das lutas concretas e de base, na defesa da vida e da ecologia;
Construção relações de gênero sem discriminações e preconceitos, em igualdade e fraternidade.
Com o sonho de Rose, continuamos acreditando na terra de Rose. Com São Sepé Tiaraju, os povos indígenas, os quilombolas, os Sem Terra, os agricultores familiares, os ecologistas e tantos irmãos e irmãs, continuamos acreditando e construindo uma terra sem males.
Assentamento da Fazenda Anonni, Pontão, 28 de fevereiro de 2017
Romeiros e Romeiras da 40ª Romaria da Terra.
As fotos foram tiradas ds redes sociais (Facebook) de Solange de Moares e Romaria da Terra (CPT – RS).
Informações: www.cnbbsul3.org.br