Feminismo! De novo querem nos explicar o que é feminismo! Já sabemos tudo. Até nos cansamos de ouvir que é a luta das mulheres por seus direitos de cidadãs! Já nos cansamos de ouvir seus gritos nas ruas e vê-las desfilando nas avenidas reivindicando o direito a serem donas de seus corpos. Já nos cansamos dos discursos sobre a paridade política, a igualdade salarial, o salário maternidade. Invadiram livrarias com seus textos repetitivos, as rádios, as televisões, os meios de comunicação digital com seus programas. O que querem mais? Chega dessas falas tão inoportunas e até ridículas quando estamos querendo lutar por coisas sérias! E coisas sérias são a economia, as verbas para compra de armas para o exército, o aumento das prisões para tantos bandidos, a abertura de novos bancos para incentivar o sistema financeiro, a economia tão fragilizada. Coisas sérias são a produtividade do campo, a produção de insumos agrícolas para exportação, a produção da soja, do boi para os mercados internacionais. Coisa séria é uma educação que ajuda a obedecer ao sistema e manter a ordem. Feminismo é para quem não tem o que fazer! Feminismo é para as mulheres que se cansaram de bordar e cozinhar! Macho não adere a nenhum feminismo!
Porém, para além desse obscurantismo que habita a sociedade em geral e fortalecido por algumas mulheres, há que aprender do que a história tem nos mostrado. Nessa linha, não se pode esquecer que feminismo é também uma luta de cidadania para os homens, porque o poder que a História desenvolveu dos homens sobre as mulheres não é poder. É usurpação de poder, é usurpação de direitos, é negação de uma igualdade cidadã, é reduzir as mulheres a objetos de cama e mesa. Por isso o feminismo deve se tornar também uma luta dos homens para os homens, um processo de reeducação masculina para os novos tempos, uma luta que acorda sua consciência para os limites de seu poder, para os limites de sua interpretação do mundo e para os limites de sua maneira de se relacionar com seus próprios corpos.
Feminismo não é coisa só de mulher. É uma forma de nos compreendermos como seres humanos interdependentes, de aprendermos a nos expressar de outros jeitos, de modificar políticas, economias, religiões e comportamentos habituais que favorecem injustiças de diferentes tipos.
O feminismo não deixa o homem menos macho como pensam alguns. O feminismo não é para frouxos como dizem outros. O feminismo não é para fracos e submissos como afirmam os que julgam sua identidade por sua força física ou por gritos de ‘ordem e progresso’.
Feminismo é coisa de homem adulto! Feminismo é coisa de homem consciente de sua humanidade! Feminismo é para os homens inteligentes, de caráter forte, capazes de rever suas posições e acolher as novas palavras de nossa História. Sem dúvida acolher o feminismo como processo educativo é uma revolução que mudaria o eixo da vida social, o eixo da História dos povos, das ciências e das religiões. Mudar o eixo significa acolher percepções plurais da vida, pontos de vista marcados pelos limites e pelas grandezas de cada corpo com sua história própria.
Até pouco tempo só se falava do homem do campo, do camponês, do agricultor como se o cultivo da terra fosse apenas masculino. Falava-se da luta dos operários, do sindicato dos metalúrgicos, dos trabalhadores na indústria e no comércio como se as mulheres não existissem e não tivessem um corpo e uma voz própria nesses setores.
Na religião a mesma história masculina se reproduz. Deus tem cara histórica e simbólica de homem, Jesus é homem e Deus e os ministros de Deus são também homens. E para que servem as mulheres? Para amá-los, servi-los e honrá-los nessa vida e provavelmente na outra se houver!
O feminismo está acordando os homens para os delírios teóricos que construíram. Mesmo os mais revolucionários e libertários só pensaram o mundo a partir deles mesmos. O feminismo com suas grandezas e limites convida os homens a pensarem sobre si mesmos, a reverem as desigualdades que construíram e justificaram ao longo dos séculos.
E, muitos homens que o acolhem, passam a enxergar a vida social e familiar de outra maneira. Por isso a mudança faz sofrer os homens porque os tira do hábito naturalizado de dominar, de ter a última palavra sobre a ciência e a política. O feminismo arranca dos homens as vestimentas de seu poder e mostra sua real fragilidade.
Os homens não foram educados para os limites, para a submissão, mas para o mando, o comando e a dominação. Acordá-los dessa ilusão não só é difícil, mas provoca imenso sofrimento e crise identitária. Quem sou eu como homem? Apenas igual a uma mulher? Posso ser igual a um homem, mas igual a uma mulher é um ato de rebaixamento psicológico e social. Por isso muitos homens rejeitam o feminismo. Rejeitam porque o temem. Rejeitam porque se sentem castrados quando as mulheres manifestam seu conhecimento, exigem justiça e direitos nas relações.
Sem dúvida há aqui um erro de percepção provindo do mundo patriarcal que educou os homens a se considerarem os princípios organizadores do mundo, da vida social e política. E por muito tempo essa atribuição foi considerada uma verdade, corroborada e mantida por Deus Pai todo poderoso! Caindo o poder superior dos homens cairia também o poder de seu Deus? Parece que sim e por isso o medo é imenso. Não percebem que o ‘todo poderoso’ de cara histórica masculina é construção humana política e que Deus, aquilo que É, a força vital presente em tudo o que existe não pode ser reduzido a um sexo, a uma imagem ou a uma doutrina.
O medo de perder poder os assola. Por isso odeiam o feminismo rindo dele. Mas não percebem que esse ódio é em grande parte ódio a eles mesmos porque não sobreviverão mais assim. Ódio das que parecem roubar as ideias que lhes deram segurança e poder. Não querem nem as dividir e nem perder seus privilégios, por isso preferem fazer a guerra. E ao fazer a guerra tornam-se assassinos, cruéis e vingativos. Matam e morrem, mas não se reconciliam com os novos desafios que a vida lhes oferece. Mesmo falando de igualdade social mantêm uma visão de desigualdade. Mesmo lutando por justiça cultivam outras formas de injustiça. Mesmo falando de bem comum, o reduzem às ideias masculinas que mantêm seu poder sobre a história dos povos.
Homens insensatos porque insistem em buscar o poder das ideias, o poder dos céus e não abraçam a interdependência de uns e outras que nos caracteriza e faz viver?
Haveria lugar para um feminismo masculino específico sem apropriação das lutas feministas? Haveria possibilidade de conversão, de reconhecimento, de uma nova maneira de sentir o mundo que nos aproximasse mais de uma igualdade de direitos possível? Estas são algumas perguntas que deveriam nos habitar e fazer crescer a reflexão e a ação das diferentes comunidades eclesiais de base.