Por Fábio Pereira Feitosa
O ano era 1958, quando o mundo assistiu a escolha de um novo Papa, era o então Cardeal Ângelo Giuseppe Roncalli, que assumiu à Cátedra de São Pedro após a morte de Pio XII (1939-1958). A escolha do Patriarca de Veneza, chamou a atenção e surpreendeu o mundo todo, considerando a idade do agora Papa João XXIII, que ao ser eleito tinha exatos 77 anos, idade vista por muitos como avançada para assumir tal cargo, muitos o chamaram de “O Papa de transição”. Todavia, ninguém imaginava quais seriam os efeitos práticos que a eleição de João XXIII traria para a Igreja.
Como mencionado anteriormente, João XXIII era visto como um Papa de transição e como tal não teria tempos suficiente para entrar para a galeria dos grande Papas. Porém, todos aqueles que compartilhavam deste pensamento e até quem não, foram igualmente surpreendidos quando em 25 de janeiro de 1959, ele anunciou na Basílica de São Paulo o desejo de convocar um Concílio Ecumênico. Desta forma teríamos o Vaticano II.
O Concílio Ecumênico Vaticano II em suas quatro Constituições, nove Decretos e três Declarações, constitui-se em uma das mais profundas e importantes reformas nas estruturas da Igreja. Ele foi responsável por introduzir esta instituição em uma nova fase, suscitando nela um novo jeito de ser Igreja, marcado pelo diálogo intra e extra muros do Vaticano. O conjunto das diretrizes conciliares resultaram no estabelecimento de um compromisso social da Igreja e sobretudo na reafirmação da opção preferencial pelos mais pobres.
A opção preferencial pelos pobres, tão falada, recomendada e vivida pelo Papa Francisco não é uma novidade na história da Igreja. Tal opção também não se constitui em uma criação que pode ser remetida à Doutrina Social da Igreja, sistematizada a partir de Leão XIII com a publicação da Encíclica Rerum Novarum. Esta opção também não é fruto das diretrizes conciliares. Ela tem como principal exemplo, Jesus Cristo: “que por causa de vós se fez pobre, embora fosse rico, para vos enriquecer com a sua pobreza (2Cor,8-9)”. A Doutrina Social da Igreja e as Diretrizes Conciliares trazem, aprofundam e aplicam os ensinamentos e a opção de Jesus para os tempos atuais, mas sem perder a essência de sua mensagem.
Ao falarmos em opção preferencial pelos pobres é importante termos em mente que ao assumirmos tal postura estamos imitando o próprio Cristo encarnado. Desta forma, esta opção deve produzir efeitos práticos na vida da Igreja, bem como em diferentes campos da vida dos seres humanos, tal como as propiciadas pelo Vaticano II. Para efetivar tal opção, o Concílio valorizou o diálogo inter-religioso e ecumênico, modificou a liturgia pra torna-la mais acessível ao povo, enfatizou a corresponsabilidade entre a hierarquia da Igreja e os leigos, assumiu o conceito de “Povo de Deus” e proclamou a necessidade de mudanças nas estruturas de um sistema gerador de injustiças sociais.
Em suma, o Vaticano II nos convida a abraçarmos um novo jeito de sermos Igreja. Tal convite foi aceito e produziu significativos efeitos, sobretudo na Igreja Latino-Americana, que por meio de vários de seus membros, buscou desenvolver diferentes formas para aplicar concretamente o espírito conciliar neste continente. Tal implementação significou a atuação desta instituição em diferentes vertentes, para assim garantir o desenvolvimento integral de seus filhos. Cada vez mais a Igreja empenhou-se na defesa dos Direitos Humanos, na busca pela inclusão social de grupos marginalizados e na luta por Justiça Social e Paz. Assim, o Vaticano II, constitui-se em um elemento legitimador de tendências já existentes no interior da Igreja. Este Concílio impulsionou o aparecimento de um grande número de profetas na América Latina, muitos dos quais em virtude de sua coragem de anunciar a Boa Nova e denunciar as mais várias injustiças cometidas neste continente, acabaram pagando com suas próprias vidas
Diante dos novos e mais variados desafios trazidos pela chamada pós-modernidade e por um sistema que se alimenta e gera desigualdades, nós precisamos assumir cada vez mais a responsabilidade de anunciarmos e construirmos o Reino de Deus. O Vaticano II, por meio de suas diretrizes, nos mostra caminhos para tal missão, assim, é preciso estudarmos, aprofundarmos e sobretudo pormos em prática o espírito conciliar. Desta forma, teremos cada vez mais uma Igreja comprometida com o desenvolvimento integral dos homens, uma igreja que não se acomoda nas sacristias, mas que vai ao encontro daqueles que estão nas periferias, sejam elas físicas ou existências. Deste modo, o espírito conciliar nos tornará de fato uma Igreja em saída, uma Igreja que vive de forma intensa o Mistério da Encarnação e o anuncia ao mundo, mostrando a este que é preciso ser sal da terra e luz do mundo, mas é também preciso ser sinal de contradição diante das grandes tentações da atualidade, o ter, o poder e o prazer. Assim, o Vaticano II nos convida a assumirmos um novo jeito de sermos Igreja, mas sem abandonarmos a mensagem e a essência do Evangelho, sem abandoarmos a Tradição e o Magistério da Igreja. Precisamos cada vez mais voltarmos ao Cristo, o Verbo que se fez carne e habitou entre nós, em uma realidade concreta, para assim buscarmos nele inspiração e discernimento para enfrentarmos os mais variados desafios que o tempo nos propõe.